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quarta-feira, 29 de setembro de 2010

1. A influência de Galaaz em Nuno Álvares

Sabe-se que na livraria de D. Duarte existia um exemplar intitulado O Livro de Galaaz, cujo protagonista, Galaaz, era filho de Lançarote e Helena. Ora D. Duarte foi contemporâneo de Nuno Álvares e este teve à sua disposição o livro que tanto o influenciou !
Comecemos por perceber a origem sagrada de Galaaz: Helena era filha do rei Peles, estando este ligado genealogicamente ao rei David e a José de Arimateia. Na posse de José estivera o Graal, através do qual se alimentara durante a sua reclusão, bebendo do sangue de Cristo.
E o contraponto, a origem maligna: Lançarote envolveu-se com Genevra, mulher do rei Artur. Consciente da traição, Lançarote anteviu a sua entrada no Inferno, sonhando com Genevra, desnuda, assumindo a sua condição de pecadora. No meio do fogo, Genevra, ao esticar a sua língua ardente, assumia-se como reencarnação do próprio Diabo, devido ao pecado capital que cometera, o adultério .
Galaaz era, apesar de ter uma veia maligna proveniente da sua genealogia, o cavaleiro eleito, a projecção de Cristo na Terra, com dotes paranormais. De facto, foi o único a conseguir sentar-se na "sedia perigosa" e, tendo sido convidado a tirar a espada do “padrão”, fê-lo como se nada fosse.
Uma curiosidade: Rita Costa Gomes, biógrafa de D. Fernando, considerou que, para além da influência que estas narrativas nórdicas (e especialmente a figura de Galaaz) exerceram na personalidade de Nuno Álvares, também influenciaram um outro herói adiado, D. João de Castro. Segundo a autora: “a coragem do infante D. João de Castro reflectida na caça ao urso e porco-bravo tinha influências do ciclo arturiano, sendo este familiar à nobreza de então”. (Gomes, 2005: 93)
Nuno Álvares Pereira procurou seguir o exemplo de Galaaz, imitando-o nos dotes guerreiros, procurando a honra que a cavalaria proporcionava, já que um fidalgo só era digno do seu nome quando tivesse passado por inúmeras aventuras. Devia, além disso, procurar manter-se virginal, privilegiando o amor a Cristo. Assim, na Crónica do Condestabre renasce um novo Galaaz, que serviria de modelo aos vindouros. Nuno tinha todos os motivos para encarnar este papel: um pai que era Prior do Hospital e a mãe, Iria Gonçalves de Carvalhal, que depois de ter dado à luz, viveu em caridade e abstinência (Cortesão, 1992: 16-17). A maternal Iria, que esteve ao lado de Nuno na defesa do partido liderado pelo Mestre de Avis, orientou grande parte da vida do filho para a abstinência sexual, exemplo que este aproveitou. Na Crónica de D. João I percebe-se quem era esta mulher: “E esta foi mui nobre dona quamto a Deos e ao mundo, vivendo em gramde castidade e abstinençia, fazemdo muitas esmolas e gramdes jejuns, nom comendo carne nem bevemdo vinho per espaço de quarenta annos.”
A influência de Galaaz em Nuno Álvares começou por ter origem na infância, altura em que as histórias de Galaaz e dos cavaleiros da Távola Redonda lhe eram lidas na corte. Atente-se na Crónica de D. João I, que parafraseia o Livro de Linhagens dos fidalgos, no capítulo vinte e um, paragrafo undécimo: “(…) desi cavallgar a mõte e a caça, nom emtemdendo em amor de nenhuma molher, nem tamsoomente lhe viinha per maginaçom; mas liia ameude per livros destorias, espeçiallmente da Estoria de Galaaz que falla da Tavolla Redomda. E porque em ellas achava, que per virtude de virgindade Gallaaz acabara gramdes e notavees feitos, que outros acabar no podiam, desejava muito de o semelhar em alguma guisa; e muitas vezes cuidava em ssi, de seer virgem se lho Deos guisasse.”

1 comentário:

  1. Como foi dito, nesta artigo, Galaaz foi um ponto de inspiração para Nun'Álvares. Concordo plenamente, e os historiadores contemporâneos falam exactamente desse aspecto, mais, desta tonalidade de vida de Nun'Álvares, podemos referir Jaime Nogueira Pinto, Oliveira Martins, José Mattoso, Joaquim Veríssimo Serrão, entre tantos outros.
    É neste âmbito, que obedecendo peremptoriamente a uma vontade divina que se serviu da sua pessoa para o cumprimento de uma missão, salvar Portugal, e dar exemplo de uma pessoa religiosa. Esta inspiração foi o que permitiu ao Santo Condestável uma entrega total, tal como na história de Galaaz na sua demanda insaciável pelo Santo Graal.

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