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Sintra - Portugal vale a pena!

sábado, 31 de março de 2012

JOSÉ LUÍS PEIXOTO – FNAC CHIADO; 31-3-2012




Uma excelente conferência, com a presença de José Luís Peixoto, sobre o ato de escrever e a Literatura em geral.

Algumas ideias [muito] interessantes sobre a escrita e a Literatura, que foram ditas e sublinhadas pelo autor e que surgiram, certamente, depois de considerável maturação. Falou-se, neste espaço de magia, sobretudo e segundo o próprio, do “ método José Luís Peixoto” aplicável a futuros escritores:

1- A escrita envolve, ela própria, um trabalho árduo e pausado, que passa pela reescrita dos textos;
2- A escrita surge do nada (um papel em branco);
3- As ideias originais devem ser maturadas até ao momento da efabulação;
4- A escrita surge a partir de uma mundividência própria;
5- Uma das conceções pessoanas sobre a escrita afigura-se como uma ideia crucial para um escritor: “Quem é aquele que vê, enquanto eu penso?!”
6- O trabalho de reconstrução do texto é essencial;
7- Sobre as palavras, há que ter em conta que existe uma impossibilidade de dizer tudo;
8- A estrutura de um texto é fundamental e esta poderá não ser regida pela estrutura ternária clássica; surpreender o leitor, a este nível, é muito interessante.
9- O escritor deverá escrever em função do leitor;
10- “O narrador é outra pessoa” (J.L.Peixoto dixit);
11- O experimentalismo pode ser muito interessante, quando se pretende escrever um texto. Um bom exemplo: retirar de um boião palavras escritas em pequenos papéis e construir textos a partir das mesmas;
12- Um outro exemplo concebido por Ken Follet, foi o de seis em seis páginas se surpreender o leitor com algo absolutamente distinto.
13- A pontuação contribui para a definição de um estilo próprio (ex: a ausência de vírgulas em textos de José Saramago)
14- A regra gramatical suprema é aquela que possibilita uma harmonia total entre leitor e escritor;
15- A seleção vocabular contribui para a definição de um estilo próprio;
16- Num romance, para além das histórias narradas que envolvem personagens, o escritor poderá imaginar outras ações, que envolvem essas mesmas personagens, não as descrevendo;
17- O papel da memória no ato da escrita é relevante;
18- Escritor é o que escreve! (J.L.Peixoto dixit; ou seja, o autor não deve deixar de escrever, mesmo que não obtenha sucesso);
19- A revisão dos textos é um aspeto crucial e poderá ser feito sequencialmente, ou depois da conclusão do texto que nos propusemos escrever;
20- Escrever …no otium; o processo da escrita, para que se atinja a excelência envolve um tempo considerável;
21- O escritor deverá manter um distanciamento em relação ao que escreve, só assim se aperceberá de aspetos a modificar;
22- Os nomes das personagens deverão ser simples! (J.L.Peixoto dixit)
23- O improviso poderá ser, apesar de tudo, importante;
24- Há uma mensagem estética a ter em conta, bem como uma musicalidade e um ritmo adequados;
25- Um autor deve acreditar plenamente no seu texto;

quinta-feira, 29 de março de 2012

Eduardo Prado Coelho



Um dia a não esquecer…

Casa Fernando Pessoa, homenagem a Eduardo Prado Coelho,
14.30m.
Entramos nesta magnífica casa e não imaginávamos o que
iríamos encontrar. Um de nós iria ler um texto da sua autoria (apresentado no
nosso blogue), homenageando o vulto da nossa literatura, cuja adjectivação
seria insuficiente para apresentar o homem de letras, que tão cedo partiu (e
hoje seria o dia do seu aniversário).

Ao entrar na Casa Fernando Pessoa, recordei a sala de aula,
do meu 12º ano, disciplina de Língua Portuguesa, onde tão pormenorizadamente
comecei a ter contacto com a genialidade de Fernando Pessoa. Os seus pertences
pessoais, os seus livros, lá estavam. Esta é sua casa, onde a sua áurea permanece
e como que nos toca. Mas o dia seria de homenagem a Eduardo Prado Coelho. Ao
entrar na biblioteca da casa já se ouviam as leituras, olhando à minha volta
vislumbrei escritores e jornalistas que tanto admiro.

A primeira pessoa que vi e ouvi foi João Barrento, o meu
caro professor de Literatura Alemã de há 20 anos atrás. Como as aulas dele me
marcam até hoje, sempre cheias de alunos (à época faltar às aulas era um
hábito, mas não às dele)!
Era um verdadeiro deleite ouvir aquele professor falar de Literatura,
um verdadeiro contador de histórias. Aulas que jamais esquecerei e foi muito
bom revê-lo.

Os testemunhos e leituras dos textos do autor homenageado
sucederam-se em catadupa; leituras de Vasco Graça Moura, Alice Vieira, António
Mega Ferreira, Teresa Patrício Gouveia entre muitos outros…

Confesso que a tarde foi enriquecedora.
Sem dúvida, um dia a não esquecer…

segunda-feira, 26 de março de 2012

UM GUARDA FELIZ E UM COELHO NO PRADO- texto lido na Casa Fernando Pessoa, a propósito do "Dia Eduardo Prado Coelho"




Aquele quarto respirava uma harmonia que emanava de tons suavemente alaranjados, que relampejavam subtilmente no edredon e nas tapeçarias. Halo sereno com impacto imediato na alma e, quem ali repousasse, gozaria a serenidade daquele espaço absurdamente emadeirado.
Paz!
A refração da luz, proveniente de uma janela sobranceira ela mesma protegida por cortinados de linho branco, confluía exatamente para o leito, uma enorme cama retangular, que se impunha naquele espaço concorrendo com a robustez da janela.
Uma cama que pedia leitor!
Ali deitado, um homem concentrou a sua atenção num livro, esperando paz. Um volumoso livro de encadernação branca e de tons alaranjados, que se camuflavam naquele espaço. Nesse livro luzia um título em letras enegrecidas, prenúncio de um final igualmente enegrecido.
Os Universos da Crítica.
No topo da parede fronteira do seu quarto, percebia-se um ligeiro menear da cabeça daquele homem. O gingar da sua cabeça era revelador de interesse e de esforço.
No seu íntimo travava uma luta consigo mesmo. Procurava a concentração absoluta, sentia receio de não entender algo. O esforço para tudo entender, resultou em minúsculas gotas de suor que iam descendo em carreirinho da sua fronte. Os olhos relampejavam. Conseguiria estar à altura do desafio? Conseguiria ler, metonimicamente falando, Prado Coelho?
Um pouco antes, já estirado naquela cama, investigara no seu portátil, ele próprio descansando nos seus joelhos gotosos, aquele nome, aquele homem, os seus textos. Por essa altura, os seus olhos refletiam as inúmeras letras que se iam substituindo em catadupa e palavras como “professor”, “ensaísta”, crítico literário” iam desaparecendo do seu alcance visual.
Ia-se embasbacando (obrigado Mia Couto!), enquanto ia enxergando todas aquelas frases. E concluiu que, bolas! Nunca iria subir aquele Olimpo, quanto mais entender aquele oráculo do saber (obrigado Sophia!) e pensou, este homem percebe de Literatura como ninguém. A sua guerra interior declarara-se, teria de reagir, fugir ao imobilismo do entendimento.
Resolveu começar a anotar nomes e teorias na sua mente enredada no livro. Esquematizar seria a sua forma de sobreviver. No entanto, esta perceção logo caiu por terra quando leu a teoria de Felman, sobre a “coisa literária”.
Decidiu rabiscar e fixar nomes, Todorov, Van Dijk, Barthres, Roman Jakobson, Mignolo, Taine, Croce, Mukarovski, Ingarden e, sobretudo, Kuhn.
Leu a Bibliografia com denodo.
Fixou uma fórmula que lhe pareceu decisiva:Literatura=mathesis+mimesis+semiosis.
O esforço começava a ser proveitoso!
Como a Literatura se conjuga harmoniosamente com os prazeres do estômago, resolveu fazê-lo pensar. Por momentos, deleitou-se com um croissant com fiambre e retomou o fôlego para novos esforços que aí vinham. Uma tempestade simplesmente provocada por um livro!
A sua lenta ervilha começava a concluir que aquele era um livro com uma linguagem hermética e, por isso, prazenteiro. Por isso, nunca pensou em desistir, mas, em determinados momentos, lia como lê uma criança o seu primeiro livro de leitura. Ainda bem que não se levou a sério, caso contrário teria enlouquecido. É que o final…no final falava-se da obscuridade da Literatura e uma frase estava encavalitada sobre a Bibliografia. Frase da autoria de Herberto Hélder. Tão complexo como este livro e o seu autor, pensou:

“Se há aqui excesso de nomes e referências, sejam tomados como montagem, concebida num apoio cultural estilisticamente irónico”

E adormeceu…

Mar Português...feito de livros!



"A única vantagem de estudarmos é gozar o quanto os outros não disseram."

Bernardo Soares, in O Livro do Desassossego

Pensamentos

"Uns procuram ramos de ouro.
Outros, filões de púrpura unindo sono a sono.
Há quem estenda os dedos para tocar as queimaduras no escuro.

Herberto Hélder, Flash

"A mim, todavia, ensinou-me [Sophia de Mello Breyner] o mais importante de tudo: ensinou-me a olhar. (...)
Quem ler com atenção, verá que esta é a moral que atravessa toda a sua escrita."

Miguel Sousa Tavares
in Público, 12 de Junho de 1999

domingo, 25 de março de 2012

Um soneto pseudo-camoniano elaborado a partir de uma música da atualidade (qual?)

Pode clamar alto…

Pode clamar alto, que eu, de si, nada oiço,
Também eu, ó pobre criatura, sei que falo
Tão alto, mas confesso que me não ralo.
Criticado? Como se estivesse no calaboiço!

Todas as suas balas, em mim ricocheteiam.
Pode tentar derrubar-me; logo me levanto;
Nada tenho a perder, não verá meu pranto,
É que eu sou de titânio, o que todos anseiam.

Atinja-me, mas estou certo de que cairá
Na cidade-fantasma, que tão assombrada é.
Mesmo que erga a sua voz, dela não sairá.

Paus e pedras podem quebrar os meus ossos;
Continue a disparar, que eu clamo ao alto
É que eu sou de titânio e avesso a remorsos.

Ler!


Mais importante do que falarmos de títulos de obras, é conhecermos profundamente essas mesmas obras!