Sintra

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Sintra - Portugal vale a pena!

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Intertextualidade...

Estabelecer uma comparação entre O Onzeneiro (personagem de "Auto da Barca do Inferno") e Ebenezer Scrooge, protagonista de "A Christmas Carol", ficção da autoria de Charles Dickens.

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

1. A influência de Galaaz em Nuno Álvares

Sabe-se que na livraria de D. Duarte existia um exemplar intitulado O Livro de Galaaz, cujo protagonista, Galaaz, era filho de Lançarote e Helena. Ora D. Duarte foi contemporâneo de Nuno Álvares e este teve à sua disposição o livro que tanto o influenciou !
Comecemos por perceber a origem sagrada de Galaaz: Helena era filha do rei Peles, estando este ligado genealogicamente ao rei David e a José de Arimateia. Na posse de José estivera o Graal, através do qual se alimentara durante a sua reclusão, bebendo do sangue de Cristo.
E o contraponto, a origem maligna: Lançarote envolveu-se com Genevra, mulher do rei Artur. Consciente da traição, Lançarote anteviu a sua entrada no Inferno, sonhando com Genevra, desnuda, assumindo a sua condição de pecadora. No meio do fogo, Genevra, ao esticar a sua língua ardente, assumia-se como reencarnação do próprio Diabo, devido ao pecado capital que cometera, o adultério .
Galaaz era, apesar de ter uma veia maligna proveniente da sua genealogia, o cavaleiro eleito, a projecção de Cristo na Terra, com dotes paranormais. De facto, foi o único a conseguir sentar-se na "sedia perigosa" e, tendo sido convidado a tirar a espada do “padrão”, fê-lo como se nada fosse.
Uma curiosidade: Rita Costa Gomes, biógrafa de D. Fernando, considerou que, para além da influência que estas narrativas nórdicas (e especialmente a figura de Galaaz) exerceram na personalidade de Nuno Álvares, também influenciaram um outro herói adiado, D. João de Castro. Segundo a autora: “a coragem do infante D. João de Castro reflectida na caça ao urso e porco-bravo tinha influências do ciclo arturiano, sendo este familiar à nobreza de então”. (Gomes, 2005: 93)
Nuno Álvares Pereira procurou seguir o exemplo de Galaaz, imitando-o nos dotes guerreiros, procurando a honra que a cavalaria proporcionava, já que um fidalgo só era digno do seu nome quando tivesse passado por inúmeras aventuras. Devia, além disso, procurar manter-se virginal, privilegiando o amor a Cristo. Assim, na Crónica do Condestabre renasce um novo Galaaz, que serviria de modelo aos vindouros. Nuno tinha todos os motivos para encarnar este papel: um pai que era Prior do Hospital e a mãe, Iria Gonçalves de Carvalhal, que depois de ter dado à luz, viveu em caridade e abstinência (Cortesão, 1992: 16-17). A maternal Iria, que esteve ao lado de Nuno na defesa do partido liderado pelo Mestre de Avis, orientou grande parte da vida do filho para a abstinência sexual, exemplo que este aproveitou. Na Crónica de D. João I percebe-se quem era esta mulher: “E esta foi mui nobre dona quamto a Deos e ao mundo, vivendo em gramde castidade e abstinençia, fazemdo muitas esmolas e gramdes jejuns, nom comendo carne nem bevemdo vinho per espaço de quarenta annos.”
A influência de Galaaz em Nuno Álvares começou por ter origem na infância, altura em que as histórias de Galaaz e dos cavaleiros da Távola Redonda lhe eram lidas na corte. Atente-se na Crónica de D. João I, que parafraseia o Livro de Linhagens dos fidalgos, no capítulo vinte e um, paragrafo undécimo: “(…) desi cavallgar a mõte e a caça, nom emtemdendo em amor de nenhuma molher, nem tamsoomente lhe viinha per maginaçom; mas liia ameude per livros destorias, espeçiallmente da Estoria de Galaaz que falla da Tavolla Redomda. E porque em ellas achava, que per virtude de virgindade Gallaaz acabara gramdes e notavees feitos, que outros acabar no podiam, desejava muito de o semelhar em alguma guisa; e muitas vezes cuidava em ssi, de seer virgem se lho Deos guisasse.”

Um percurso de visita pela Zona Oeste: "BuddhaEden" e Castelo de Óbidos

Rodeado por uma extensa zona vinícola, a perder de vista, o viajante encontra um traço exótico na paisagem,o BuddhaEden, repleto de estátuas em tons de branco, vermelho e dourado que emergem numa extensa mata, onde predomina o sobreiro . Vale a pena visitar o valioso e exótico jardim que colocou a zona do Bombarral na rota (obrigatória) do turismo cultural neste país à beira-mar plantado.
De facto, tão próximo de Óbidos está o BuddhaEden, que se pode planear uma visita aos dois locais tão enriquecedores, mas, ao mesmo tempo, tão distintos. Óbidos faz reviver o Portugal medievo a quem se aproxima desta localidade, vindo de Lisboa pela A8. O viajante parece que se teletransporta para uma época em que os burgos amuralhados dominavam a paisagem.
Quando se visita pela primeira vez o exótico jardim, fica-se surpreendido pelos gigantescos buddhas e pelas filas de soldados, coloridos, em terracota.
Contudo, o único folheto informativo sobre o local é parco em informações. Portanto, caros amigos, toca a pesquisar primeiro sobre a História da China, para que se evitem comentários como os seguintes:

-Olha, olha, estes [soldados] estiveram na guerra entre Portugal e Espanha!
-Olha aqueles pezinhos tão amarelinhos!

terça-feira, 28 de setembro de 2010

Sobre uma adaptação do conto "O Tesouro" de Eça de Queirós

É impensável que numa adaptação didáctica do conto "O Tesouro", de Eça de Queirós, exista um esquecimento surpreendente: o dístico árabe, prenúncio de uma maldição que leva à morte dos três protagonistas, Rui, Guanes e Rostabal.
Este pormenor é tão fundamental para o desenrolar da intriga, (onde existe um nítido traço de fatalismo) que, sem a sua presença, quase não vale a pena contar esta história de morte e ambição, que tem como cenário de fundo um dos reinos ibéricos, durante a Baixa Idade Média.

domingo, 26 de setembro de 2010

UM DESAFIO SOBRE SHAKESPEARE, por Sandra Marques

As olheiras marcam o olhar deste homem. O seu gesto é ponderado, a sua voz poderosa, trágica.

- Como se chama?
- William. William Shakespeare!
- William, o que o levou a deixar Stratford, optando por Londres?
- Gostei muito de Stratford, do seu clima, da “Grammar School”…de Anne Hathaway. Foi aí que nasceram os meus dois gémeos, Judith e Hamnet, bem como a minha pequenota, Susanna. Mas sabe como é, Londres é sempre Londres!

O dramaturgo retira os fones, dos quais se escuta, quase em surdina, a "Suite nº 3 de Bach". Alisa, entretanto, a extensa pêra que lhe cobre parte do rosto (“Shakespear(e)”).
A mão nervosa folheia um livro de Ovídio. Ao longe avista-se Marlowe, apressado.

- O que o levou a ser actor?
- Sabe, sempre fui um actor na verdadeira asserção da palavra. Mas decorreram alguns anos até me decidir. Na minha mente existia a dúvida: `Ser ou não ser eís a questão`. “Henry VI” obteve grande êxito. A Rainha gostou do meu trabalho e tudo evoluiu num ápice! Fundei, depois, uma companhia de teatro, “Lord Chamberlain´s Men”…que tinha os melhores actores do Reino, o Richard, William Kempe.
- Escreveu comédias, mas também tragédias no final dos anos 90…
- Por essa altura, reflectia-se na sociedade um sentimento de grande pessimismo. Depois, os problemas pessoais…
- Que pergunta gostaria de deixar aos nossos leitores?

- A SEGUINTE: QUAL DAS MINHAS PEÇAS É QUE VOS AGRADA MAIS? NÃO SE ESQUEÇAM DE FUNDAMENTAR A VOSSA OPINIÃO!

sábado, 25 de setembro de 2010

AFINAL O PARAÍSO TERRENO TEM NOME: MONSERRATE

Palavras-chave: ingleses; William Beckford; Francis Cook; Lord Byron; influências indianas; Romantismo; ruínas; jardins exóticos; DESCRIÇÃO LITERÁRIA.

Na entrada a Quimera, prenúncio de todo o exotismo que surpreende quem visita pela primeira vez estes jardins. Virando à esquerda, a vegetação cerrada num ambiente húmido e com várias tonalidades de verde. O granito milenar compõe o quadro, onde predomina a serenidade e a paz. As múltiplas fontes, tanques e cascatas são verdadeiros sonoplastas que fazem alternar o ruído e o silêncio. É tudo esmagador!
As pseudo-ruínas de uma capela, nicho de três sarcófagos etruscos (actualmente no Museu de Odrinhas), remetem o visitante para uma época histórica, o Romantismo e o século XIX. Quem entra nessa capela sente o mistério. Mais abaixo, abre-se toda esta densa vegetação em clareiras inacreditáveis, paradisíacas: o Jardim do México, o primeiro relvado plantado em Portugal. No topo da colina o exótico palácio de Monserrate, rodeado de exóticas árvores, provenientes da China, Japão, Austrália…
Figueiras, Plátanos, Palmeiras, Ciprestes, Pinheiro de Norfolk, Gingko Biloba, numa irmandade verde, com tons mais ou menos suaves.
O geométrico palácio adornado de painéis indianos de alabastro, colunas de mármore rosa, arcos góticos, tectos surpreendentes, os retratos de Francis Cook e da esposa numa biblioteca forrada com estantes de nogueira, faz desejar ao visitante que a visita se eternize.
À saída do palácio, a fonte de Tritão e (mais) um delicioso tanque com peixes e amenos sons de uma cascata. À direita a cafetaria, funcional, onde sobressai, em primeiro lugar uma calma esplanada.
Antes da saída um falso monumento pré-histórico, fruto da imaginação de Beckford.

Uma visita inesquecível!

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

PASTICHE DE UMA NOTÍCIA (in, "A Bola", 23 de Setembro de 2010, p. 24)

(Destinatários: alunos do 9º ano)

Palavras-chave: pastiche (pesquisa do significado); "Auto da barca do Inferno"; "Auto da Índia"; notícia

GRANDE JOGO EM BARCELOS

GIL VICENTE TENTA A SUBIDA, DESDE QUE DESCEU DE DIVISÃO EM 2006

Depois de ter obtido duas vitórias em dois importantes jogos, o Gil Vicente é líder isolado do campeonato da Segunda Liga. Tudo isto graças ao seu novo técnico, Manuel.
Esta semana, o Gil Vicente irá defrontar, no palco de Barcelos, e para a taça intertoto,o seu adversário castelhano, F.C de Encina. O encontro será arbitrado por João, o terceiro... árbitro do seu distrito, com o mesmo nome.
O Gil Vicente alinhará com Joanantão na baliza. A defesa será composta por Joane, o Onzeneiro, D. Anrique e Babriel. No meio-campo evoluirão o Procurador, o Corregedor, Cavaleiro 1 e Cavaleiro 2. Na frente, as duas mais recentes aquisições: Lemos e o Castelhano.
Manuel, o primeiro... treinador de Barcelos, agendou treino para hoje e só no final do dia dará a conhecer a convocatória.

NOMES LATINOS DE LEGUMES, FLORES E FRUTOS

Legumes

Alface – Lactuca
Feijão - Phaseolus Vulgaris
Pepino - Cucumis Sativus
Cebolinho - Allium Sholnoprasum
Cenoura - Carota
Rabanete - Raphanus Sativus
Ervilha do Jardim – Pisum Sativum
Alho-Porro – Allium Porrum
Espinafre – Lucullus
Ervilha-de-Cheiro – Lathyrus Adoratus
Couve – Brassica
Nabo – Napus

Flores

Rosa - rosa
Margarida – Bellis
Cravo – Dianthus Caryophyllus
Girassol – Helianthus annus
Lírio - lilium

Frutos

Melão - Cucumis Melo
Uva - Uva
Maçã – Malum
Pêra – Pirum
Morango – Fragum
Laranja – Malum Arantium
Limão – Malum Citreum
Figo – Ficus
Banana – Ariena
Pêssego – malum Persicum

Nomes Científicos de Animais

O Latim é utilizado na nomenclatura científica de carácter zoológico, como se pode constatar a seguir:
Albatroz errante – Diomedea exulans (Exulans- que exila)
Cisne negro – Cygnus atratus (atratus- enegrecido)
Corvo – Corvus corax (corax–corvo)
Gorila – Gorilla gorilla
Jaguar – Panthera onça
Lince Ibérico – Lynx pardina
Lobo – Canis lúpus lúpus (cão lobo, lobo)
Orca – Orcinus orca
Tigre – Panthera tigris (tigris- tigre)
Tubarão branco – Carcharodon carcharias
Urso polar – Ursus maritimus (urso marítimo)
Viúva negra – Latrodectus mactans (mactans- que mata)

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

PARVOS - II

O parvo Joane (farsa “O Velho da Horta”, 1512) - Comparativamente com o Joane do “Auto da Barca do Inferno”, este Parvo, conquanto não distinga bem a realidade que está para além do seu pensamento limitado, não ofende, não pragueja, não utiliza termos escatológicos, exibindo um comportamento muito próximo da normalidade. A situação cómica onde intervém, surge quando a mando da “dona” tentar convencer o marido desta, um Velho, do qual era criado, a ir jantar. Este Velho, apaixonado, suspirava pela Moça que o tinha ido visitar (afinal seria ele o verdadeiro Parvo!).
Além de tudo, este Parvo, de nome Joane (nome característico de Parvos durante o século XVI), apresenta outros recursos. Assim, é um Parvo que sabe tocar viola, revelando apetências surpreendentes. Não compreende, ainda, porque o Velho não se sente tentado a degustar um suculento jantar, mostrando-se, assim, bastante alheado em relação à realidade circundante.

Hum Parvo (Tragicomédia Frágua de Amor, 1525)- comparativamente com outras peças de Gil Vicente, neste auto o Parvo representa um papel de curta duração. A determinada altura e no curto diálogo encetado, provoca uma confusão linguística ao trocar o termo “tinta” por “trinta”, revelando ser pevidoso.

Joane, o parvo (Auto da Barca do Inferno, 1517) – é a personagem que evidencia, neste auto, os três tipos de cómico, mas, sobretudo, o de carácter, agindo sempre como uma criança grande.
O cómico de situação ocorre (na cena em que é protagonista e intervém para julgamento do Diabo e do Anjo) quando pergunta ao primeiro se deverá entrar no batel infernal… de pulo ou de voo. O cómico de linguagem está evidente quando utiliza um vasto reportório linguístico que contribui para a sua eficácia em palco. Na verdade, o seu discurso é elíptico, faz uso de termos escatológicos e obscenidades. Autocaracteriza-se e caracteriza, ainda, outras personagens de forma acutilante, azeda, mas ao mesmo tempo inocente, tais como o Frade, o Corregedor e o Judeu, constituindo-se como um poderoso adjuvante de duas entidades antagónicas, o Anjo e o Diabo.
A sua “simpreza”, tão apreciada entre os católicos, entre os quais se encontram Gil Vicente e os próprios reis (conjuntamente com o rei D. Manuel I e a rainha D. Leonor, são os leitores/espectadores ideais desta moralidade), e o facto de não ter “errado per malícia”, são contributos inigualáveis para a sua entrada no Éden, ficando a aguardar, ao longo da peça, que chegue esse momento.

PARVOS -I

Exercício: comparar os Parvos dos diferentes autos de Gil Vicente.

O parvo Joane (Auto da Fama, 1510), personagem masculina, auxilia uma moça de nome Fama a qual será pretendida pela França, Itália e Castela, mas só o reino Português a merecerá. Nesta farsa, o parvo Joane apresenta características comuns a outros autos, nomeadamente a preguiça e por “sonhar que era tolo” sonhava com o céu de Deus. Além disto, enquanto a Moça conduz as patas a preceito, tratando-as de “meninas fermosas”, o Parvo condu-las de forma enlouquecida, desejando que a raposa as mate ou que se afoguem, já que estas lhe dão imenso trabalho. Utiliza o palavrão, pragas, e interpela sobretudo o pretendente francês tentando afastá-lo, o que pode ser ilustrado pela seguinte expressão: “”Hou Franchinote, fora, fora…” .


O parvo Joane (Auto Pastoril Português, 1523), personagem masculina, neste auto adquire uma relevância pouco habitual, já que o diálogo entre ele e uma pastora de nome Catherina é bastante prolongado e centralizador. Joane, aliás, revela-se inicialmente enamorado desta pastora, apresentando uma linguagem mais próxima da norma de então (inquere inclusivamente a pastora sobre se alguém a importuna, a engana). Enfim, um linguarejar mais reflexivo do que é habitual num Parvo. Supostamente apaixonado, proclama: “Sempre eu hei de ser comtego/Lá detrás da casa ó sol.”, num assomo quase poético. No entanto, nem todos as características do parvo anedótico estão arredias desta personagem, pois, afinal, numa fase posterior confessa que por ela “subiu à pereira” e que “Eu não quero de ti nada/Senão abraçar como amiga”, para depois e num jogo de sedução intrigante e revelador de uma densidade psicológica acentuada, confessar que “Porque as lágrimas me sãe/O dia que te não vejo” e projecta para Catherina ser “bem toucada”. Como esta o rejeita, o parvo questiona: “A Índia não está hi?”. Afinal se ele soubesse desta rejeição nunca lhe teria dado a roca que trouxera de Santarém. Depois deste diálogo surgem pastores e pastoras que procuram casar o Parvo.

O Parvo (Floresta de Enganos, 1536), personagem masculina, sem nome aparente, preguiçoso (tem como projecto dormir “quatro ou cinco meses”), servil (trata o filósofo por amo), revela em simultâneo a inconsciência própria dos parvos e utiliza um bordão, a interjeição “Apihá”. O filósofo adverte-o por isto: “te vas del abrigo/Al perigo que no sientes”.
Este Parvo, que representa a pureza, a ingenuidade, revela-se como um precioso contraponto face à gnosiologia que é apanágio do Filósofo. Será a condenação da pretensa arrogância deste representante do saber que é aqui posta em causa, de tal forma que este trará acorrentado “hasta el morrir” aquele que classifica de “necio” e de “bobo”.

Um Parvo (Auto da Festa), personagem masculina, apologista da sesta, revela-se preponderante neste auto pelo protagonismo que assume. A Verdade, uma personagem alegórica, reconhece em relação a este parvo que: “…aquele rei jocundo/o privou dos bens do mundo/que lhe dará o do céo.” Está aqui bem patente a condenação dos bens materiais, bem como a apologia da pobreza e da simplicidade, que proporcionam o paraíso. Porteiro neste quadro alegórico que é o céu, confronta-se com a sua própria mãe, uma velha, que, cruel, lhe revela que em má hora o pariu, o viu e o criou, porque ele a “envelhetou” e afinal ela não é tão velha como isso.

CARTA PESSOAL DE FERNANDO PESSOA A UM PROFESSOR

(aviso: para compreender este texto é preciso conhecer-se o mundo Pessoano. Objectivo: contextualizar esta carta com a obra do produtor de “A Mensagem” )

Lisboa, 15 de Junho de 1932

Exmo. Senhor;

Registo com desagrado, múltiplas e heteronímicas informações que me têm causado um certo desassossego e ao amigo Bernardo Soares. Com efeito, dois confrades: Alberto Caeiro, que toma conta dos meus rebanhos e Álvaro de Campos, engenheiro, cujo Chevrolet lhe provocou uma inveja mítica, confidenciaram-me que o Senhor tem…vindo a difamar-me nas suas aulas, apelidando-me de preguiçoso intelectual, ao semi-analisar poemas meus, que reflectem a – MINHA - vontade de não pretender pensar. Não desejará, certamente, o caríssimo, que eu telefone ao meu amigo futurista, Almada Negreiros, de forma a que ele escreva um outro manifesto Anti-Dantas (N.E – lamentamos a ausência do ponto de interrogação por vontade expressa do autor desta carta).
Uma outra mensagem que me foi segredada, por uma amiga ceifeira, foi a de que o senhor me anda difamando, nas suas aulas, apelidando-me de fingido. Ora, caro senhor-embebido-em-máquinas-difusas-e-longínquas, é o senhor que me vai dizer quem sou?
Digo-lhe que jamais o perdoaria, nem que fosse amigo de Cesário, Camilo Pessanha ou Antero. Nem que fosse o próprio Sidónio!
Um outro amigo, órfico, de quem eu, deliberadamente, ocultarei o nome e o brasão, disse-me em surdina, de uma forma breve…leve…suave, que o senhor teve dores ao ler os meus poemas. Ora, muito bem feito!!!
O senhor, supostamente, não-fumador, ensinou nas suas aulas algo que me contraria: que o Paulismo tinha sido imaginado por um seu primo, com o nome de Paulo; que eu tinha escrito no "Jornal do Benfica”, ao invés de "A Águia"; que eu tinha parecenças (físicas) com Camões; que eu tinha um parente que tinha sido rei; que eu tinha uma série de irmãos gémeos.
O senhor volta a difamar-me e aos meus amigos e passa-lhe um comboio por cima, a toda a velocidade. Pior: afundo-o…num paul. O senhor volta a enganar-se, ISTO que seja e eu 1,2,3,45…Norte. Olhe que quem anda à chuva (oblíqua) molha-se!!!
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Agora que estou mais calmo, deixe-me dar-lhe alguns conselhos:
1. Evite ter uma alma pequena!
2. Seja Descontente!
3. Busque o poder e renome de Portugal!
4. Nunca saia à rua com nevoeiro!

Subscrevo-me com os meus melhores cumprimentos e máxima consideração.

Fernando António Nogueira Pessoa
UM DIDÁCTICO E BIOGRÁFICO POEMA

Objectivo: fomentar a pesquisa biográfica sobre o poeta Manuel Maria Barbosa du Bocage a partir de um texto produzido pelo professor. Leitura do “Auto-Retrato” escrito pelo poeta sadino.

Palavras-chave: Setúbal, Universidade de Coimbra, madame Anne-Marie Le Page du Bocage, Francês, Latim, Índia, Nova Arcádia, “Nicola”, frei José da Conceição Veloso, Pina Manique (fonte: http://pt.wikipedia.org, consultado às 15.53h de 23/09/2010).

GENUS IRRITABILE VATUM


Pressente-se os pomos da magreza,
Sobressaindo na tristeza da facha,
Pressente-se a luz do talento acesa,
Uma figura nervosa e baixa.

É mesmo um sacana de versos,
Da ira ao furor vai um fio:
Deixa os fracos poetas possessos,
Incendeia os cafés do Rossio!

“É Elmano Sadino que fala”
Escutam-no no Nicola, na prisão;
E do discurso emotivo exala
Um cheiro forte de paixão.

Perscruta as níveas mãos de Marília,
Onde prevê o pérfido destino,
Quimera contra a vileza e maldade
Na voz do poeta-menino.

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

(ALGUMAS) PALAVRAS E EXPRESSÕES-CHAVE DA LÍRICA TROVADORESCA

Selecção aleatória:

Idade Média – Latim – Igreja – Retórica Clássica – escola poética provençal – trovadores – jograis – peregrinos – romarias – “romanço” – cultura laica e profana – sátira – galego-português – poesia precede a prosa – introdução dos grupos consonantais /nh / e /lh/ - séculos XII a XIV – castelhano – D. Afonso X – Cantigas de Santa Maria – soldadeiras - cantigas de Escárnio e Maldizer – D. Dinis – cantigas de Amor e de Amigo – musicalidade - Sirventês – refrão – paralelismo – cantigas de mestria – amor cortês – mesura – a senhor – suserania – Professor Rodrigues lapa – platonismo – natureza – a mãe – canto e dança – coita de amor – “prez” – “bem falar” – “morrer de amor” – “coplas” – “finda” – “atafinda” – “palavra perduda” – “mozdobre” – dobre – arcaísmos – “leixa-pren” – tenção – Arte de Trovar – CBN – C. Vaticana – Cancioneiro da Ajuda - João de Lobeira – Amadis de Gaula – Ai flores do verde pino – Bailia – Alba – Chanson de Toile – “Roi queimado morreu com amor” - nobreza – “Ai, dona fea, fostes-vos queixar” – ciclo Pré-Alfonsino – Martim soares – Pai Gomes Charinho – Ciclo Alfonsino – João Airas de Santiago – Ciclo Dionisíaco - Alba – Martim Codax – Barcarola – Pastorela…

E outras….

Bibliografia: Poesia e Prosa Medievais, selecção por Maria Ema Tarracha Ferreira, 2º edição, biblioteca Ulisseia, Lisboa, 1988

DESCOBERTA (RECENTE) DE UM MONSTRO DA MITOLOGIA GRECO-LATINA...

G.S. Clark, filólogo, descobriu, muito recentemente, um maço de manuscritos cuja datação remonta aos épicos tempos da guerra de Tróia. Neles, Clark encontrou e decidiu revelar ao mundo um novo ser mitológico, o IC 19.
Numa publicação científica intitulada “Estranhos Seres”, Clark descreveu este ser obnóxio, que só sossega perto das cinco da manhã. Atentemos nas palavras do estudioso:

“O IC 19 é polviforme. O seu corpo é constituído por chapas metálicas e alcatrão, sendo a tonalidade predominante do seu disforme corpo, o cinzento. Vive num habitat bem definido entre Sintra e a Segunda Circular.
Este monstro, que ruge sobretudo de manhã, exala odores semelhantes aos que provêm dos tubos de escape das nossas grandes cidades (n. e - referia-se a Londres). O seu rude linguarejar faz lembrar um conjunto de buzinas. Os seus olhos, raiados de sangue, lembram dois faróis ligados no máximo.
Este ser é absolutamente imprevisível: ora se enche abruptamente, ora se esvazia sem qualquer explicação. Na mitológica guerra entre as IC e as IP, destacou-se dando a vitória às primeiras.”

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

EÇA E A GASTRONOMIA - I

Todos nos recordamos dos opíparos piqueniques que fazem parte integrante das pequenas histórias de Enid Blyton, designadamente das aventuras de “Os Cinco” e os “Sete”. Foram essas histórias, infanto-juvenis, de aventura e mistério que me fizeram entender o quanto o tema da gastronomia pode promover, no leitor,o gosto pela leitura. Relembro, por exemplo, os scones, que o julian, a Georgina, a Anne e o David degustavam e, porque na altura nunca os provara, imaginava o quanto seriam saborosos. Ou seja, este era um tema obsidiante (obsessão) nas narrativas de Blyton.
O mesmo acontece em muitos romances de Eça e também em alguns dos seus contos. A este propósito, Andrée Crabée Rocha escreveu um artigo intitulado "Um motivo obsidiante na narrativa queirosiana", publicado em cadernos da Literatura, Coimbra, 1981.
Segundo a autora, são muitas as referências alimentares nas obras de Eça, Talvez por inspiração dos banquetes de Flaubert.
Em Os Maias, Eça faz referência a quinze refeições completas, em A Cidade e as Serras (e “Civilização”) são mais que seis e em A Capital são incontáveis os banquetes.
A mais importante refeição acaba por ser a de Jacinto, em Tormes, que define a transfiguração do protagonista. Uma outra refeição que define a respectiva intriga, ocorre em”Frei Genebro”, acabando por ser a causadora (e decisora) da ida da personagem para os Infernos.
Além disto, são muitas as personagens representadas no acto de comer...

OS “CONTOS" DE EÇA DE QUEIRÓS

É como conteur que Eça se revela um escritor magistral e muito versátil, afastando-se dos rótulos de realista e naturalista que habitualmente lhe atribuíam em virtude da sua adesão à Geração de 70. Eça participou em conferências realizadas no casino Lisbonense (em 1871), que são um verdadeiro manifesto geracional. Os seus contos, curtos (cf., sobretudo, “Frei Genebro”), têm, apesar de tudo, as soberbas e alongadas descrições que eram apanágio de um autor realista, sendo verdadeiras peças de arte (porque foram "polidos” minuciosamente) sob o ponto de vista retórico.
Publicados já no século XX (1902), os “Contos” são a prova de que este autor tinha (afinal) múltiplas influências: era o naturalista e realista em “Singularidades de uma Rapariga Loura”, como considerou Fialho de Almeida que foi mais longe ao declarar que esta foi a primeira narrativa realista escrita em português; o admirador dos clássicos greco-latinos, em “A Perfeição”; o conhecedor da Idade Média em “A Aia” e em “O Tesouro”(conto que também denota influências clássicas, quando se aborda o tema da ambição humana) e finalmente o autor que sofria pelo dilema de ser crente, ou de seguir os preceitos da Geração de 70, como se comprova em “Frei Genebro” (implicitamente; se discute o tema é porque se encontrava, por esta altura, dividido. Mais adiante, quando da terceira fase da sua obra, acaba por ser personagem central do ambiente social e político, abdicando do seu papel de ser participante na realidade colectiva ).

O AVÔ QUE FAZIA DISCURSOS DE TERNURA…

“Carpent tua poma nepotes” (Virg.): os netos colherão os teus frutos”

Conheço um avô que, tal como todos os outros, passa a vida a dizer que o seu mais precioso tesouro são os netos. E, conheço alguém que guarda religiosamente todos os pequenos discursos, que esse avô faz por altura das festas de aniversário de todos os seus netos.
Discursos que não são peças de oratória, mas sim de ternura!
Foi essa pessoa que me fez chegar um desses discursos, rasurado, e com algumas incorrecções sintácticas(que procurei corrigir). No entanto é um dos melhores discursos que li até hoje, porque me liguei sentimentalmente àquele papel amarelado e amarrotado.

Os sete anos do M.

Está de parabéns o M. por mais um aniversário. A partir de aqui vai ser um menino ainda mais responsável, porque a esta característica acrescenta ainda a inteligência e a sensibilidade. Sobre a última característica, tenho notado que reage, sempre que alguma coisa não está correcta, com uma surpreendente ternura.
Além disto é um menino que está sempre atento ao Bem e ao Mal, porque procura ser sempre bondoso.
Fico estupefacto pelo facto de os adultos (já desde a minha infância, há 70 anos atrás), em particular aqueles que estão à frente dos destinos da educação, não terem em conta que as crianças têm de se deslocar largos quilómetros, para puderem ir à escola.
Por isso digo aos meus netos que a aprendizagem é feita com muito sacrifício. Devem estudar muito porque só assim conseguirão ter sucesso!
Forte é aquele que consegue o que quer, por isso M. vai em frente e nunca desanimes. Assim ultrapassarás todos os problemas que te forem surgindo nesta vida difícil. Cresce e sonha, porque o futuro é teu!
Os avós paternos desejam-te muitas felicidades e um futuro risonho!

domingo, 19 de setembro de 2010

Hoje partilho convosco um estado de espírito… por Sandra Marques

Após uma semana exaustiva de trabalho…sim que se desengane quem pensa que nesta profissão não se trabalha arduamente (designadamente ao Domingo)! Só assim se tem sucesso. O tempo e a preparação são fundamentais. A aula deve ser preparada em função do plano A, do B e porque não do C, caso os anteriores não estejam a surtir o efeito desejado. Deve-se estar sempre preparado e evitar ser surpreendido, de forma a não sermos incapazes de dar resposta à situação. Essa é a grande diferença!

Mas como dizia, após uma árdua semana de trabalho, o cansaço impera, contudo há que resolver assuntos na preparação das aulas/reuniões para a semana seguinte e, no final da tarde de 6ª feira, dirigi-me para uma das escolas onde lecciono. Enquanto procurava alguém com que deveria falar, passei pela pátio exterior da escola, onde os alunos gozavam o seu recreio e eis que ouço ruidosamente e em uníssono: TEEEEAAAAAACHER!!!!

Pois é, eís que sou abalroada por uma multidão de jovens estudantes que estavam com saudades da sua professora e que muito afectuosamente e sem pudor, mostraram os seus sentimentos mais sinceros.

Rapidamente me vi encurralada por estes jovens, completamente imobilizada. Tive de arranjar solução para poder sair da situação em que me encontrava e ao mesmo tempo corresponder ao afecto que havia sido alvo…mas de forma mais organizada.

Confesso que todo o cansaço que sentia, desapareceu! O peso da mala, o cansaço nas pernas e aquela dor de cabeça que teimava em não desaparecer, rapidamente foram substituídos. O sorriso foi imediato, o coração cheio e uma serenidade e paz inigualáveis.

Pensei, “…É por isto que vale a pena lutar todos os dias por esta profissão, infelizmente por vezes tão desprezada. É por isto que a escolhi! O sorriso destes jovens não tem preço, a minha gratidão é incomensurável!”

Vale a pena! É sempre este o meu pensamento quando termino as aulas e vejo que aqueles jovens aprenderam algo que lhes será útil no futuro, algo que os tornará adultos responsáveis na sua profissão, algo que por mais que se considere inútil hoje, o será verdadeiramente importante amanhã!

Convosco partilho este estado de espírito! Com colegas de profissão, alunos e todos os restantes, pais ou que ainda não sendo pais, relembram os seus dias de estudantes.

Com todos partilho, não mudava de profissão por nada, apesar de tudo!

Como diria Johann Wolfgang Goethe: «O que torna a vida abençoada não é fazer aquilo de que gostamos, mas sim gostar daquilo que fazemos».

sábado, 18 de setembro de 2010

OS PAPÉIS DO INGLÊS, de Ruy Duarte de Carvalho ;

“…mais do que o achado, vale sempre a busca”


Os Papéis do Inglês é uma ficção que apresenta como subtítulo “O Ganguela do Coice” (ganguela é um nativo originário da África central e, nesta estória, é também o avô do Paulino, personagem que cozinhava para “o branco” e que tinha visto tudo, ou seja o mistério que este policial acaba por encerrar) sendo classificada pelo narrador como “uma estória angolana”.

Mas a classificação deste policial angolano só estará completa a partir do momento em que é revelado ao leitor que esta estória é uma invenção completa, elaborada a partir de uma crónica de Henrique Galvão. Esta crónica relatava um acontecimento trágico, a morte de um antropólogo Inglês, que se suicidara em 1923 no Kwando, depois de ter morto tudo à sua volta, inclusivamente um antropólogo grego obscuro e oportunista. Archibald, de seu nome, foi inicialmente ilibado devido ao laxismo de um chefe da polícia local.
A palavra invenção é fulcral neste contexto, já que é reveladora da versatilidade deste narrador (também ele antropólogo) e dos seus “golpes de cintura” (p.26), que domina a seu belo prazer toda a intriga, procurando (sempre) surpreender o leitor, que tem de ir compreendendo as três versões da estória e a narração, que não é ordenada cronologicamente.

Em termos formais, o livro encontra-se dividido em duas partes fundamentais, intercaladas por um Intermezzo (curioso!). O referido Intermezzo estabelece uma comunicação decisiva entre o livro primeiro, dedicado a uma narratária específica e um segundo livro, com um cariz etnográfico considerável. Este segundo livro é o da viagem, das datas e das descrições de lugares, do surgir de novas e importantes personagens e do trabalho etnográfico de um antropólogo que não descurava a literatura (ou não tivesse ele a febre literária dos primeiros antropólogos), sobretudo a obra de Conrad.

O que liga o primeiro e o segundo livros é a procura incessante, quase febril de um tesouro porque”… é aí que estará o coração daquele que o procura”, como é referido a determinada altura pelo narrador.

Esta estória de “suicídio e crime” que termina com um final “singelo”, mas esclarecedor, vai alimentando desde o início as expectativas do leitor e da narratária, como se constata pela frase que denuncia a estratégia do narrador, “É coisa que guardo para contar-te à frente” (p.33).
No final da narrativa, o leitor descobre finalmente que a versão completa do narrador difere da de Henrique Galvão (a original e verdadeira) e da de Luiz Simões, porque nesta sobressai a visão do Ganguela, o avô do Paulino. Ou seja uma estória policial, que decorre em África, envolvendo o mundo da Antropologia, e que encerra três versões entrelaçadas e narradas, aparentemente, de forma desordenada!
Um estória que dá que pensar, tal como os policiais de Agatha Christie.

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

LABOR

O trabalho tudo vence, consideravam os antigos (labor omnia vincit). Esta asserção foi, por vezes, aproveitada subversivamente (arbeit macht frei), com fins menos próprios.
Entretanto e face a toda esta apologia do trabalho que domina os nossos dias, pode também haver espaço para quem defenda o dolce far niente. Assim, damos à estampa os princípios orientadores do "Clube dos Preguiçosos":
1 - Nasce-se cansado e vive-se para descansar;
2- Ama a tua cama como a ti mesmo;
3 - Se vires alguém a descansar, ajuda-o;
4 - Descansa de dia, para dormir de noite;
5 - O trabalho é sagrado. Não lhe toques;
6 - Aquilo que podes fazer amanhã, não o faças hoje;
7 - Trabalha o menos que puderes. O que tens para fazer, faz com que outro o faça;
8 - Nunca ninguém morreu por descansar demasiado;
9 - Quando te vier a vontade de trabalhar, senta-te e espera que passe,

A voz às minorias!

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

SÓSIAS

A vida é feita de pequenos nadas que lhe dão sentido e que, por vezes, nos fazem sorrir.Isto a propósito de sósias, duplos, personalidades fragmentadas. Como sabem o tema é recorrente em Literatura. Recordo, por exemplo, um título: "O Homem Duplicado" de Saramago; um vilancete de Bernardim Ribeiro: "Antre mim e mim mesmo"; o possível alter-ego de Eça, João da Ega, em "Os Maias"; a heteronímia pessoana; "Dr. Jekyl and Mr. Hyde" de Stevenson, uma moderna alegoria sobre as forças do bem e do mal que se debatem na personalidade humana (cf. Evans, Ifor, História da Literatura Inglesa).
Pessoalmente, não esqueço o dia em que entrei no Centro Comercial Colombo e pensei que me estava a ver ao espelho. Por essa altura, eu e o meu sósia estugámos o passo e (certamente) interiorizámos a inacreditável situação. Numa outra ocasião, viajando de barco a caminho do Barreiro, numa tarde de Estio com uma temperatura altíssima, recordo que quando me aproximei do pequeno bar do navio, a barmaid me interpelou, inquirindo:
- Então o que fazes por aqui?
Por essa altura fiquei a saber que tinha um sósia na Margem Sul! Mas o mais inacreditável aconteceu quando duas colegas de Mestrado me confundiram com um colega, do Norte, que era...pauliteiro de Miranda. Ainda hoje me rio da situação, tal como elas próprias!
Fica a pergunta: já conheceram o(s) vosso(s)sósia(s)?

Siddhartha de Hermann Hesse, por Sandra Marques

Siddhartha de Hermann Hesse

Hoje remeto-vos para algo completamente diferente das anteriores obras, excepto num aspecto… a excelência da escrita.

O autor? Tão somente Nobel da literatura em 1946, penso que diz tudo.

Siddhartha, a personagem principal nasce na Índia no século VI a.C., filho de um brâmane e vive toda a infância e juventude longe das misérias do mundo. A certa altura, abdica de toda esta vida luxuosa e parte em peregrinação pelo país, onde toma conhecimento da pobreza e miséria aí existentes. Na sua viagem existencial experimenta de tudo, inicia-se nos jogos de amor, experimenta o jejum absoluto e escolhe o caminho intermédio, libertando-se dos apelos dos sentidos e encontrando a paz interior.

O homem que tudo teve, de tudo abdicou, e no final tornou-se barqueiro num rio junto ao sábio Vasudeva e só então conhece a redenção.

Numa época em que se apregoa que o tempo é tão precioso, onde vale mais o que temos, do que aquilo que somos, podemos deixar-nos conduzir, através desta obra, para uma viagem interior.

Siddhartha teve tudo e de tudo desistiu, a riqueza, o amor – o prazer carnal e o amor a um filho, a sabedoria dos samanas, a doutrina de Gotama – Buda. Ainda assim ele percebeu que não chegava, por mais que admirasse a sua doutrina.

Foi como barqueiro, com o ancião e sábio Vasudeva, na simplicidade da sua vida e da riqueza do silêncio do rio, que ele percebeu e encontrou o que tanto procurava… O SER UNO!

Um livro a não perder!

O perfil do novo seleccionador (uma perspectiva literária)

O novo seleccionador nacional deverá ter as seguintes características:

- A capacidade de sonhar(com óptimos resultados)como António Gedeão e Homero;
- A capacidade de incutir os valores pátrios, tal como Pessoa e Camões;
- E, ao mesmo tempo, defender a miscigenação de culturas, tal como Mia Couto;
- a anulação do eu, tal como Herberto Helder;
- Uma "pitada de humor", tal como Gil Vicente e Eça;
- Simplicidade de processos, tal como Miguel sousa Tavares;
- Ser um apaixonado (pela selecção), tal como Florbela Espanca;
- Recorrer ao auxílio divino, tal como Vasco da Gama, em "Os Lusíadas";
- Invocar a mãe (nos piores momentos, dizer: "Ai, mãe!), tal como Eugénio de Andrade;
- Celebrar a vida,ter energia, tal como Whalt Whitman;
- Ser um mestre da estratégia (frásica), tal como os autores latinos, nomedamente Cícero;
- Viver (obcecadamente) o futebol, tal como Pessoa o fez em relação à Literatura;
- Fomentar o exercício físico por sugestão de António Gedeão, em "Calçada de Carriche" ("Luísa sobe/sobe a calçada");
de qualquer forma e parafraseando Pessoa: "É a Hora!"

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Sobre a frase de Carlos Queirós, ao jornal "Expresso"

Carlos Queirós, em entrevista ao jornal "Expresso", afirmou que Amândio de Carvalho "decidiu pôr a sua cara na cabeça do polvo".
Ora, a frase não tem qualquer sentido pejorativo e envolve, apenas, uma questão de semântica. Carlos Queirós informava o público sobre o facto de, finalmente, termos alguém com dotes premonitórios em tudo semelhantes aos do polvo Paul, durante o mundial de 2010. E é inquestionável que estes dotes poderão ser muito úteis à selecção nacional.
Por isso, queriamos aqui restituir a verdade, ou seja..."A César o que é de César"!

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Quando dei aulas numa prisão: primeiras impressões

UM HORÁRIO MUITO ESPECIAL…

Relembro o dia em que me dirigi à escola para receber o meu horário. Aquela folha de papel transformou-se subitamente num projéctil disparado contra mim próprio. As primeiras gotas de suor frio invadiram-me a face e eu, na confusão dos sentidos, procurava manter o equilíbrio.
Nos dias seguintes sorvi todas as histórias e notícias, vinculando-me ao assunto e procurando ver alguma luz no que se afigurava como o breu, o tenebroso. A surpresa foi evidente, mas, para não desmerecer a minha hereditariedade, resolvi sobreviver!
No entanto, as noites eram penosas, tinha corpo sem o sentir e era difícil conciliar o corpo. Durante o dia, acontecia o recobro, mas aquela odisseia era para mim bastante agreste e as pernas tremiam-me como um canavial em dia de ventania.
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Relembro o edifício fronteiro da prisão: muros aguareladamente brancos, portas maciças de metal de um verde carregado. Cá fora alguns reclusos, em sistema de regime aberto, moviam-se maquinalmente. Sobretudo recordo os olhares, de um frio cortante, diferentes, que na maior parte dos casos estavam dissociados da alma ansiosa de paz. A entrada neste inferno de Cumas era feita através de movimentos sincopados, pois havia que abrir muitas portas verdes, maciças. Na memória ainda retenho o chocalhar das chaves, que iam abrindo languidamente aquele extenso labirinto.
As armas! As armas faziam parte deste quadro surrealista, bélico…metálico. Muitas vezes, reparei que elas estavam apontadas a alguém e aprendi a vê-as sem as sentir.
Conheci os meus alunos… irmãos de escrita. A vida foi correndo. Os sentimentos foram-se diluindo, mas uma nuvem de dureza recalcada apoderou-se de mim e jamais me irá largar. Hoje em dia, faço uma comparação entre este filme surrealista e outro que para mim foi marcante…Platoon de Oliver stone e, por analogia, chego à conclusão que a prisão foi o meu Barnes!

Fernão Lopes

HISTÓRIAS QUE SÃO ARQUÉTIPOS
Enquanto passeava pela Fnac, não pude deixar de pensar que as histórias reais de Fernão Lopes são arquétipos narrativos, modelos para escritores de outros séculos. Nas suas narrativas evoluem, segundo a sua focalização, os vilões como o Conde Andeiro, apaixonado pela "rainha má", Leonor Teles, heróis como Nuno Álvares, um líder inteligente como D. João I, verdadeiro animal político, um velho determinado como Álvaro Pais e muitos outros. Assim, influenciado pela matéria do ciclo bretão, e pela sua versão ibérica, Lopes acaba por ser uma referência para a Literatura Portuguesa a posteriori.
Eís um caso em que a realidade ultrapassa, definitivamente, a ficção!

terça-feira, 7 de setembro de 2010

“Cada homem é uma raça” – Mia Couto, por Sandra Marques

Inesquecível…. Livro para ler e ser relido.

Como já partilhei convosco anteriormente, o meu gosto pela leitura é algo intrínseco, tal como um qualquer aspecto físico, faz parte de mim e como sabem sou uma leitora que lê avidamente. Por isso, posso-vos dizer que a leitura deste livro demorou apenas algumas horas.

E o mérito deste facto é todo do autor.

Continuando a minha leitura de vários autores, não poderia deixar de parte Mia Couto, autor moçambicano sobejamente conhecido e detentor de vários prémios literários.

Neste livro, Mia Couto apresenta 11 contos. Estórias cujas descrições minimalistas e extremamente claras, captam de imediato a atenção do leitor. Nelas encontramos uma miscigenação da língua portuguesa com palavras e dialectos africanos.

Nestes contos, o leitor sente profundamente a vivência do povo moçambicano, as suas vivências, os sentimentos, a dor, a miséria, vendo-se transportado para os espaços descritos e sentindo-se envolvido pela teia de uma linguagem magistralmente construída, inequivocamente pessoal.

Por isso, classifico a leitura deste obra de puro deleite.

Não consigo escolher um conto que possa destacar, mas evidencio “O embondeiro que sonhava pássaros" ou “ Sidney Poitier na barberia de Firipe Beruberu” como os meus preferidos, mas assinalo os restantes: "A Rosa Caramela", "O apocalipse privado do Tio Geguê", "Rosalinda, a nenhuma", "A princesa russa", "O pescador cego", "O ex-futuro padre e sua pré-viúva", "Mulher de mim", "A lenda da noiva e do forasteiro", "Os mastros do Paralém".

Sandra Marques

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

"Como Água para Chocolate" por Sandra Marques

Continuando a partilhar a minha leitura de férias convosco remeto-vos para o livro "Como água para chocolate" de Laura Esquivel. Esta autora mexicana retrata uma história de amor entre Pedro e Tita que se vêm impedidas de casar devido a uma tradição de família, em que sendo ela a filha mais nova, nunca poderia casar e teria de tomar conta de sua mãe até à sua morte. Tita assiste assim ao casamento de Pedro com a sua irmã, Rosaura, sendo, inclusive, forçada a partilhar o lar com eles. Tita apenas partilha esta história de amor com a sua criada índia ( Nacha) que lhe vai soprando aos ouvidos receitas e conselhos na vida e na morte.

Esta narrativa roda em torno da cozinha e de um certo número de elementos culinários. Tita vai construindo a sua relação com Pedro através de receitas típicas e por vezes invulgares. As receitas são apresentando uma para cada mês e transmitem os sentimentos de Tita por Pedro. Ao longo desta obra vamos também conhecendo histórias paralelas como:os amores ilegítimos da autoritária e cruel mãe de Tita (Mamã Elena) e a fuga da irmã Gertrudis com um soldado e alguma peripécias de uma guerra civil.

Nesta obra, Laura Esquivel transmite um grande erotismo na descrição deste relacionamento proibido entre Tita e Pedro, conhecemos as tradições do México pela gastronomia, há uma referência à cultura índia ancestral, mas acima de tudo esta obra é um elogio ao amor.