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segunda-feira, 14 de novembro de 2011

EMAIL SOBRE A GÉNESE DOS ANTÓNIOS


AOS PESSOANOS…a little joke!

NOTA AOS LEITORES MENOS AVISADOS: é necessário conhecer-se os textos e a mundividência pessoana, para que se entenda este texto. Por isso, comece por ler, por favor, a “Carta da Génese dos Heterónimos”!

EMAIL SOBRE A GÉNESE DOS ANTÓNIOS

A Rodolfo Cascais Moiteiro, meu seguidor no facebook

c.c : António Caeiro; António Reis; António de Campos e António Soares.

Lisboa, 13 de Janeiro de 2005

Prezado camarada Rodolfo:

Agradecemos o teu mais recente email e, sobretudo, a sinceridade do teu desabafo para connosco, digo comigo, quanto ao estado daquela “Tabacaria”, na Baixa, junto à “Brasileira”, onde existe uma estatueta de mim próprio, feita no dia do meu “Aniversário”.
Começamos por te pedir desculpas por não te enviarmos o habitual fax, mas hoje é domingo, os correios estão fechados, o nosso pombo-correio tem uma pata magoada, está com medo de voar por influência directa da tanatofobia do António Reis, e, por fim, não pretendemos pensar mais sobre este assunto, porque de dores de cabeça já nos basta a de hoje, que tentamos aguentar estoicamente.
Passamos, digo, passo agora a responder à tua imaginária pergunta sobre a génese dos Antónios, facto que me provocou uma “Velha Angústia”, já que é difícil explicar uma coisa destas a qualquer Pessoa, quanto mais a um professor de Literatura do teu gabarito. A verdade é esta: pontualmente fico possuído por outrem, ou seja, julgo que sou múltiplo! Nestas ocasiões encarno a personalidade, a expressão facial e a forma como escrevem três Antónios que eu muito admiro e de quem te falarei detalhadamente, mais adiante.
“Ó céu!” já pedi “Conselho” a um médico (esse mesmo!). Minto, já tive uma conversa com o farmacêutico do meu bairro, Sebastião de seu nome, que me diagnosticou abulia e histeria…em simultâneo. O problema é que estas transfigurações ocorrem sobretudo no restaurante da esquina, quando vou buscar a minha “Dobrada à moda do Porto” (geralmente fria), ou na drogaria do André, exactamente às 16h20m e 30segundos. E quando ocorrem esses transtornos, começo a gesticular, a estrugir, a ferrear, a ciciar e a falar como o António Caeiro, o António de Campos, ou o António Reis. E as pessoas interrogam-se, ficam estupefactas, desassossegadas. E eu (depois) nem me mexo, pareço um novelo voltado para o lado de dentro e quando me perguntam se me estou a sentir bem, penso: “Abdica, sê rei de ti próprio, deixa de ser plural!”
“-Mas, afinal, quem são estes Antónios!” – perguntas tu, ou suponho que perguntas. E eu pergunto:”-Afinal quantos sou?”
Começo por te dizer que, desde miúdo, em Lisboa e em Durban, que gosto de falar com pessoas imaginárias, com as quais nunca dialoguei efectivamente. É verdade que nunca gravei nenhuma destas conversas, o que é pena para todos nós, mas posso-te afiançar que, em determinada ocasião, falei pessoalmente com a Rainha de Inglaterra, no Palácio de Buckingham, à hora do chá, diante de um prato de scones acabados de fazer. Uma simples conversa bilingue sobre estas minhas imaginações, que ela comentou com muita graça. Numa outra ocasião, entrevistei o pacifista Gandhi, sobre o livro de Tolstoi, Guerra e Paz. Por fim, uma ceifeira alentejana, despreocupada, boa cantadeira, que me disse ser “invejoso”, porque eu lhe tinha dito desesperadamente que pretenderia ter um trabalho daqueles, ao ar livre, sem ter de passar o tempo a ler livros. E, como sabes, ler não é nada, chega é a ser uma maçada!
O primeiro dos Antónios era, inicialmente, só António e nunca leu esta “Mensagem”, (que tive de escrever para ganhar cinco contos de reis). Foi aos seis anos (que saudades!) que isto aconteceu e como não encontrava um segundo nome para esse ser imaginário, ficou “Pá!”. António Pá! Era uma forma fácil de chamar o outro que era eu próprio e era muito musical. Lembro-me vagamente, que noutra ocasião, assumi o papel de um televisivo médico, de barba rala, que coxeava e encarava o acto médico em si, como se um mistério policial se tratasse.
Passados anos, encarnei a figura de António César, quando da sua campanha na Gália, vitorioso de Vercingetórix, para assumir de imediato o papel de Napoleão, às portas de Moscovo, montado num alazão branco, que foi subitamente destituído por António Churchill, durante a Conferência de Ialta, de charuto na boca. Enfim, uma vertigem! Eh-lá-hô!
Digo-te, Cascais, tenho saudades desses tempos!
Como já percebeste, sou múltiplo e também como já percebeste, quando começo a teclar, não paro!
Vou entrar, então, na génese dos Antónios literários, que é o que pretendes saber ocultamente. Foi em 2002, salvo erro, que comecei a escrever poemas pseudo-escritos por António Caeiro, que na realidade é um vizinho meu, do 3º esquerdo, pastor na Malveira e que tem uma característica incomum. Gosta de olhar fixamente as pessoas e depois entra em transe. É verdade que o seu olhar não tem propósitos intimidatórios, pois ele acaba por ser um homem tranquilo.
Foi num dia de Março que eu, recorrendo ao meu Magalhães, escrevi de pé (até começar a sentir um formigueiro nos dois pés) cerca de trinta poemas de sua autoria e todos em redondilha menor e com a costumeira volta ou glosa. Numa luta comigo próprio, deixei de lado a postura, a voz, a escrita deste António e passei a ser eu próprio. Apertava o meu próprio pescoço, numa luta desigual, e cheguei à conclusão que, afinal, o António Caeiro não existia. Mas aí vinha o António de Campos e eu não o sabia! Escrevi então, de rajada, o poema “Chuva Molhada”. Trata-se de um poema interseccionista (e tu bem sabes o que isso significa), onde existem vários planos: chuva/sol; Porto/Benfica; interior/exterior; doce/amargo;
Mas se esse António Caeiro era o chefe dos Antónios, tratei logo de lhe descobrir discípulos e, então, apareceu o António Reis, através de uma visão quimérica que muito me surpreendeu, porque depois a absorvi. Por essa altura, estava eléctrico, neurasténico, e comecei a falar, a agir e a escrever como o António de Campos, surgindo o manifesto futuristico-bucólico intitulado “Bode Triunfal”. E o pior é que eu assumia, por momentos, ora o falar de um, ora de outro e acabámos os três a discutir uns com os outros. Fantástico, não é?!
Quando da publicação da revista “EU?”, surgiu um poema de António de Campos, antes de ter caído sob a influência campesina de António Caeiro, sobretudo do seu gosto desmedido por galináceos. Esse poema é o célebre “Aviário”!
Passo agora à identificação dos três Antónios, porque presumo que queiras saber tudo sobre os evasivos de mim próprio.
António Reis nasceu em 1988, é portuense (sócio nº 1305 do FCP), louco por tripas, tem uma acentuado sotaque da zona do Porto, trocando habitualmente os /v/ pelos /b/, terminando os ditongos nasais em /on/ e chamando “cimbalino” ao habitual café. Entretanto foi para o Brasil, onde abriu um abriu consultório médico conjuntamente com uma médica brasileira, Lídia de seu nome, habitualmente sentada numa secretária contígua à sua.
António Caeiro nasceu em 1980 e em Lisboa, na freguesia dos Olivais, mas viveu toda a sua vida no Campo de Santana. Era pastor, frequentou um curso profissional e Mestre, não o sendo.
António de Campos nasceu próximo de Tavira, em Monte Gordo, no dia 15 de Outubro de 1991 (às 13.31h da tarde). Campos é Engenheiro Mecânico (pelo ISEL), mas agora é pró-activo.
Reis é o mais baixo (1,50m), depois vem Caeiro (1,51m) e só finalmente o altíssimo Campos (1,52m).
Caeiro é louro, de olhos azuis, queimado de solário; Reis moreno, com uma pequena calva; Campos tem cor trigueira, usa óculos de aro escuro e masca pastilha elástica. Reis é monárquico, latinista e semi-helenista; tem simpatia pela Grécia, embora reconheça a gravidade do “problema grego”.
Por que razão escrevo em nome dos três? Simplesmente porque mo pediram e quem sou eu para me contrariar a mim próprio?! Além destes três, não me posso esquecer de António Soares, meu semi-heterónimo, porque é como se tratasse um irmão gémeo, com a simples diferença de que não é apreciador de pastéis de nata, pelos quais eu sou perdido! Qual destes quatro é que escreve melhor o Português? É evidente que é Reis, o latinista. Caeiro escreve muito sobre a realidade do campo, integrando na sua poesia, palavras como “cabeço”; “monda”; “palheiro” ou “galinhas”. Campos gosta de falar de “motores”; “parafusos”; chaves de fenda” ou “alicates”.
Mas que manicómio é este, pensarás tu, ó caríssimo Cascais? Nenhum, direi eu. Vale mais falarmos de factos surpreendentes, como os que te falei, ou falarmos de banalidades como o estado do tempo, que por acaso hoje nem está grande coisa, já que nuvens carregadas e cinzentas é o que há mais no plúmbeo céu por cima da rua do Arsenal e dos Douradores e de toda esta Lisboa. Enquanto te escrevo, aproveito para escrever à minha Ofélia, apesar de considerar Shakespeare, como um “dramaturgo atabalhoado”, não menosprezo a felicidade do nome e, ao meu lado, neste momento está…António Baldaia. Cumprimentos, prezado camarada…

FERNANDO ANTÓNIO NOGUEIRA PESSOA

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