Sintra

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Sintra - Portugal vale a pena!

domingo, 24 de outubro de 2010

GRU, O MALDISPOSTO


Longe vai o tempo em que os criadores de animação tinham como primeira intenção expor uma visão maniqueísta do mundo (cf. "Branca de Neve e os Sete Anões"). De um lado os bons, do outro os maus, sem que houvesse espaço para que os maus tivessem momentos bons e vice-versa. James Finn Gardner, através dos seus "Contos Tradicionais Politicamente Correctos" trouxe a visão do cinzento (por exemplo na subversão do conto popular, que deu origem a uma animação, "Os Três Porquinhos e o Lobo Mau" ).
Em "Gru, o Maldisposto",a concepção maniqueísta também existe mas acaba por ter uma particularidade distinta. De facto, nesta animação produzida por Chris Melendrandi, acabam por ser três miúdas que fazem gerar, no malvado Gru, sentimentos de ternura e bondade, já que, entre os adultos, só existem Vectores ou Grus.
Este Gru, calvo e de nariz aquilino, é muito semelhante, em certa medida, ao Príncipe-Sapo de um famoso conto tradicional, ou ao Monstro que contracena com a Bela, num outro conto popular. Feio por fora, bonito por dentro... mas, em relação à beleza interior, só durante uma parte da sua existência fílmica! Para além da animação em 3D, este filme acaba por ser uma bela revelação da criança que existe em cada adulto.

SOBRE A LITERATURA...BALÍSTICA

De um amigo, professor de ....

"Uma das vantagens da criação literária é a de podermos arquitectar histórias, que até podem ser um espelho da realidade. Os visados apenas podem ter um pressentimento [e não o podem afirmar claramente] de que aquela história...é a sua história!"

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

A TEORIA DO PRÉ-CINEMA É FUNDAMENTAL PARA QUE SE ENTENDAM AS CRÓNICAS DE FERNÃO LOPES

1- A teoria do pré-cinema
Recorrendo à teoria do pré-cinema, consegue-se entender um dos objectivos primordiais - o da propaganda ad eternum da Dinastia de Avis - que presidiu à elaboração da cronistica redigida por Fernão Lopes no longínquo século XV. Para que se perceba esta ideia há que começar por dizer o seguinte: estes textos são paraliterários, escritos num português medieval (onde proliferam, por exemplo, os hiatos), e são um retrato inequívoco da mundividência medieval, absolutamente dicotómica, que medeia entre o sagrado e o profano. Os escritos de Fernão Lopes estão repletos de acção (batalhas, cavalgadas, revoltas populares, assassínios atrozes, planos maquiavélicos), descrições físicas e psicológicas exímias das personagens, umas assumindo o papel de heróis outras o de vilões, bem como cenários interiores e exteriores. Os protagonistas são o primeiro rei da Dinastia de Avis, mas também os seus antecessores D. Pedro I e D. Fernando, secundados por personagens femininas como D. Inês, no primeiro caso e D. Leonor Teles no segundo.
D. Filipa de Lencastre acaba por ter um papel menor na Crónica de D. João I, sobretudo face à relevância de Leonor Teles na Crónica de D. Fernando e na de D. João I. Leonor é uma personagem que fica para sempre, verdadeiro paradigma da maldade.
Portanto estes textos têm à partida imensas potencialidades cinematográficas, até ao momento muito pouco exploradas, não só por terem intrigas e personagens interessantes, cinemáticas, mas também por serem um fresco da sociedade medieval portuguesa e um caso em que a realidade ultrapassa definitivamente a ficção.
A encomenda de D. Duarte a Fernão Lopes, a de cronicar o carismático reinado de seu pai e dos respectivos antecessores, tinha como grande objectivo deixar para a posteridade a descrição dos tempos difíceis relativos à Crise Dinástica de 1383-85, o modo como foram superados pela dupla imbatível D. João, Mestre de Avis e Nuno Álvares Pereira (o primeiro assumindo o papel do político versátil e o segundo o do militar imbatível), bem como a acalmia posterior. Enfim, a felicidade que permitiu refundar um reino que tinha sido, segundo concepção de Fernão Lopes, superiormente dirigido até ao reinado de D. Fernando. Assim, as três crónicas permitem ao leitor estabelecer um paralelo verdadeiramente estimulante entre os três reinados a que se reportam, e não é difícil concluir, com facilidade, que o de D. Fernando acaba por ser o mau exemplo para os reis posteriores e para o povo (pela sua fragilidade militar, pela forma como delapidou o tesouro real que tanto trabalho deu a juntar aos seus antecessores) que os mesmos iriam governar. O reinado de D. João I será, então, um grande exemplum…didáctico para a realeza que secundou D. Duarte e para a que com ele conviveu!
Mas de que forma poderá a referida teoria, ( que por vezes revela alguns excessos na sua concepção), contribuir decisivamente para que se entenda as crónicas do trabalhador incansável, que recebeu de D. Duarte uma tença para retratar, em pequenos capítulos (que iam sendo lidos na corte), o promissor começo da Dinastia de Avis?
Jorge Urrutia , catedrático espanhol, contribuiu para a definição desta teoria, a do cinema avant la lettre, porque descreveu o percurso da sua génese, o que permite um entendimento claro da mesma. Tese, essa, que teve como progenitores alguns autores francófonos e hispânicos. O nascimento tardio só foi confirmado no ano de 1936, mas depois esta teoria evoluiu como uma bola de neve. Uma ideia extraordinária (pela simplicidade que encerra) que reluziu em Reflexions sur la Literature da autoria de Albert Thibaudet, no já referido ano de 1936, onde se sublinha a preocupação humana, secular, de fixar (e esta é uma palavra-chave), pela palavra, a realidade circundante, já que as cameras de filmar são recentes.
Joaquin de Entrambasaguas, considerou, em 1954, que muitas obras literárias anteriores ao cinematógrafo, apresentam aspectos absolutamente filmáveis, porque o espírito que animou a sua redacção encerrava, inconscientemente, a expressão cinemática e, entre outros exemplos, refere os da Divina Comédia, Odisseia, Ilíada e Eneida. Esta ideia do autor espanhol é, sem dúvida, muito mais aplicável às crónicas, caleidoscópicas, do nosso Fernão Lopes. A propósito de expressão cinemática, nos textos do nosso cronista coexistem dois tipos de linguagem: a denotativa,através da qual as palavras apenas têm o seu valor real, reflectindo uma aproximação à realidade e uma outra,em muito menor grau, a conotativa, onde são evidentes os tropos. Por fim, existem as imperfeições medievais como os pleonasmos.
1955 e o tempo não pára! Este foi um ano mirabolante (para a evolução da nossa teoria) em que Pierre Francastel se questionou quanto ao facto de poder ter existido um cinema anterior ao mesmo, ou seja antes da invenção do próprio cinema. Afirmação fundamentalista é certo, mas que acaba por ser determinante para o entendimento e consolidação da teoria do pré-cinema.Entendia Francastel que, no passado, já tinha existido uma atitude pré-filmica operacionalizada através do modo de olhar a realidade circundante e de a fixar em texto.
Passados nove anos, Étienne Fuzellier teorizou o seguinte: desde Homero um grande número de escritores foram "visuais", reforçando as ideias de Joaquin Entrambasaguas;
Mais ainda, Fuzellier considerou que desde sempre existiram guionistas, segmentadores, montadores, que antecipam, através da palavra, a imagem. Esta é uma literatura, segundo o autor, que pretende “fazer ver”, uma literatura que é constituída por um repertório de obras que podem ser traduzidas por imagens. E são realmente muitas as obras que se enquadram neste pressuposto. A esses autores só faltou mesmo uma camera e, voltamos a dizer que Fernão Lopes é um deles.
A teoria continua a evoluir, a consolidar-se, e, pela primeira vez, através de Fuzellier, sugeriu-se que o Cinema e a Literatura coincidem na conformação dos géneros. Mas, eis que surge o exagero: alguns teóricos do pré-cinema, Fuzellier, Paul Leglise e outros, pretendiam, a determinada altura, que o ensino da literatura, as obras clássicas deveriam ser analisadas através de planos cinematográficos! Na realidade acaba por ser um trabalho interessante percebermos o “olhar de Virgílio” e delimitarmos os primeiros planos em que se enquadram Juno ou Eneias no primeiro livro da obra virgiliana, tal como o fez Paul Leglise, em 1958, no entanto este acaba por seu um percurso redutor.

2 - Adequação desta teoria aos Estudos literários Medievais
2.1 O Guionista
Existem semelhanças significativas entre a crónica lopesiana e o guião cinematográfico, ou televisivo da actualidade e semelhanças evidentes entre o trabalho do cronista e do guionista. Estes dois tipos de texto poderão conter, em simultâneo, personagens integradas em enredos, a narração de histórias dinâmicas e interessantes, conflitos declarados que conferem interesse à intriga, o uso do discurso directo, uma estrutura dramática conseguida, técnicas de gestão do tempo e uma linguagem simples e acessível ao leitor ao espectador. É possível, então, dizer-se que este Fernão Lopes poderá ser, afinal, um argumentista avant la lettre? O que é facto é que os seus textos, em função da sua intenção de deixar “filmes” dos reinados dos três reis em causa para a posteridade, acabam por estar muito próximos (sobretudo em relação à Crónica de D. João I) do que é o guião cinematográfico. Por isso, Fernão Lopes será, em nosso modesto entender, um pseudo-guionista com séculos de antecedência, facto que deriva da sua atitude pré-fílmica.
2.2 - O trabalho de montagem
Fernão Lopes procurou reproduzir a realidade histórica e a sua pena poderia corresponder a uma máquina de filmar. Poderia ser (imaginariamente) o cineasta ao serviço de D. Duarte. O que está aqui em causa é a importância do (seu) olhar, do modo como focaliza os acontecimentos. Contudo o que ele fez verdadeiramente bem – perdoe-se o anacronismo - foi um “trabalho de montagem”( dos testemunhos recolhidos, dos que viram os acontecimentos, por exemplo quando da batalha de Aljubarrota), mas de uma “montagem invisível” que procura encapotar a visão subjectiva da “camera de filmar”, ou da própria “montagem”. Este trabalho de Fernão Lopes foi o da recomposição do que escutou e leu. Convenhamos que acaba por ser um trabalho de filmagem, mas em segunda-mão. E o que filmou e remontou o cronista? Muita coisa! Para além dos reis de quem fala nas suas crónicas (e a sua "camera” acompanhou-os permanentemente), os ambientes cortesãos, as cidades do seu reino, o povo, os burgueses, a guerra com os castelhanos, as festas, as procissões, e muitos outros acontecimentos, ou seja “filma” (ou volta a “filmar”) os séculos XIV e XV em Portugal, desde o reinado de D. Pedro I.

domingo, 17 de outubro de 2010

TEACHING IS A WORK OF HEART

Hoje partilho convosco um sentimento que assola o meu espírito desde há alguns dias...

Eis a história:

Há alguns anos fui convidada pela responsável de um colégio, onde actualmente trabalho, para leccionar Inglês. O horário na outra escola onde trabalhava era compatível com o segundo e logo aceitei o desafio. Contudo, e de imediato, apoderou-se de mim algum receio: a tarefa era a de ensinar crianças do 1º ciclo e eu nunca o tinha feito. Confesso que já trabalhara com todas as faixas etárias, excepto com esta. E tive dúvidas se estaria preparada para o fazer.

Hoje reconheço, que estas crianças me conquistaram de imediato. Por isso não me canso de considerar que as crianças nos devolvem, duas vezes, aquilo que lhes damos, quer seja o bom quer o mau. Mas mesmo naqueles dias em que já venho cansada das anteriores tarefas e chego ao pé deles, aqueles sorrisos e abraços devolvem-me toda a energia necessária. Mesmo que no fim o dia a cabeça esteja cansada, o coração está cheio!

Partilho, então convosco a história de um dos meus alunos, a quem vou chamar António.

O António foi sempre o melhor estudante da turma em todos os níveis: brilhante desempenho, comportamento irrepreensível, atitude colaborante, era sempre o primeiro a levantar o dedo para participar todas as actividades realizadas. Respeitador das regras de sala de aula, nunca se levantava ou participava sem levantar o dedo para eu dar qualquer autorização. Esmerado, fazia todos os trabalhos de casa e participava diariamente nas aulas, de forma efusiva.

A certa altura o António mudou radicalmente o seu comportamento, não cumpria as regras estabelecidas, implicava com os colegas, estava distante e já não participava como antes. Logo verifiquei que algo se passava e perguntei à educadora que os acompanha na escola o que se passava. Ela disse-me que tinha havido um drama pessoal com um familiar muito próximo, um problema de saúde grave. E desde então o António nunca mais foi o mesmo. Tentei todas as estratégias, trabalhei individualmente com ele, tentei incutir-lhe o espírito do trabalho em grupo, falei com os pais e com ele, sempre dizendo à educadora (que também estava empenhada em ajudá-lo), que eu não ia desistir desta criança e tudo ia fazer para ter o [velho] António de volta. Por isso, ia ajudá-lo no que pudesse.

O António tornou-se muito calado e nunca falava desse familiar doente. Um dia, no final do ano lectivo anterior, fiquei a falar com ele no fim da aula. Ele, então, desabafou os receios que tinha no seu coração de criança: também se achava responsável pela situação. Falei permanentemente com ele, ajudei-o como pude, explicando-lhe a situação e ali não fui professora, mas senti-me um pouco a mãe daquele menino.

Passado algum tempo, no final da aula, falei desse familiar com ele, de repente ele começou a falar dele sem parar, e eu nunca o interrompi. Olhei para a educadora que os tinha vindo buscar às aulas e ambas percebemos o que tinha acontecido.

Abrira-se a caixa de Pandora! Ele falava, como nunca tinha falado, desse familiar.

Contudo, o António manteve o comportamento transgressivo no início deste ano lectivo. Uma vez mais, falei com a educadora, reforcei que ia continuar a lutar por ele, agora que já estava no 4ºano, queria tê-lo de volta, com o seu comportamento e atitude irrepreensíveis. Há duas aulas atrás, o António portou-se muito bem e, no fim, frente aos outros alunos, elogiei-o, disse-lhe que ele se tinha portado muito bem, que estava a ser o “velho” António e que eu estava muito orgulhosa dele. Respondeu-me com um sorriso!

Na última aula voltou a portar-se muito bem, participando muito mais activamente e senti que estava a ter o António de volta. No fim da aula falei com a educadora para lhe dizer que eu estava radiante, pois o António nas duas últimas aulas tinha estado muito melhor… até o elogiei! Ela respondeu-me: - Eu sei, professora. O António veio ter comigo, pegou na minha mão e disse-me com um sorriso que a Teacher o tinha elogiado muito. Não falámos, apenas olhamos uma para a outra e sorrimos, os nossos olhos iluminaram-se.

Espero amanhã ter o meu António de volta, a participar empenhado e atento! Não desisto nunca, basta um sorriso dele e de todos os Antónios para perceber que valeu a pena!

Cumpri a minha missão. É por isto que ensinar vale a pena hoje e sempre!

Teaching is a work of heart!

여러분의 방문에 감사드립니다

Sendo este um blogue aberto(por enquanto), temos tido algumas visitas curiosas. Durante a última semana de Setembro, um grupo de amigos sul-coreanos visualizou este blogue. É para eles que deixamos a mensagem inicial, esperando que o tradutor do google seja eficaz.
MUITO OBRIGADO PELA VOSSA VISITA!

AS CIDADES INVISÍVEIS, DE ITALO CALVINO

Nesta invulgar narrativa, pela existência de uma narrativa apresentada em fragmentos significativos, Marco Pólo maravilha o kublai kan com descrições de cidades do Ocidente…que apenas existem na sua imaginação.
Portanto, neste livro há que sublinhar dois aspectos fundamentais: o poder da narração, impulsionado pela imaginação do narrador e o exercício (soberbo) de concretizar múltiplas descrições literárias.
Falaremos, aqui, da descrição da cidade de Bauci (Calvino, 2009:83). Após uma caminhada de sete dias, chega-se à cidade que não se consegue ver. A cidade está suspensa numas andas e eleva-se acima das nuvens. Os habitantes podem descer delas por escadotes, mas preferem ficar lá em cima onde têm tudo. A verdade é que os habitantes de Bauci odeiam a Terra e contemplam-na através de binóculos, sentindo um fascínio pela sua ausência.

PERGUNTA: QUAL SERÁ A (FICCIONADA) MENSAGEM DE MARCO POLO A KUBLAI KAN (tenha-se em atenção que se pressente aqui a voz do autor)?

EXERCÍCIO: IMAGINAR UMA CIDADE, RECORRENDO A UM DELÍRIO IMAGINATIVO.

UM CONSELHO DE VISITA: MUSEU DE SÃO MIGUEL DE ODRINHAS

O Museu de São Miguel de Odrinhas, para além das bucólicas paisagens que o rodeiam, é exemplar em relação ao que deve ser o trabalho museológico, sendo um bom testemunho do mundo da Romanidade no território da antiga Lusitânia.
No seu espólio há que salientar a existência de sarcófagos etruscos e respectivas inscrições (lembram-se de Monserrate, dos sarcófagos que lá faltam?), bem como a existência de um número considerável de inscrições tumulares dos habitantes lusitano-romanos pertencentes à zona circundante a Olisipo (área rural). Estas lápides permitem constatar a preferência dos habitantes locais pela cremação, rejeitando a influência etrusca e cristã, que advogava a inumação.
Além disso, as inscrições lapidares permitem não só perpetuar a memória de alguém, mas revelam, também, importantes aspectos do quotidiano destes habitantes, como sejam os respectivos tria nomina, o ano em que faleceu um determinado habitante, a invocação aos deuses manes (antepassados), a tribo a que pertencia, quem mandou fazer a respectiva lápide e o seu poder económico (verificável pelo tamanho e riqueza da lápide).
O museu dinamiza interessantes actividades didácticas como sejam:
- “LITTERARUM DUCTUS, nesta actividade os alunos são convidados a escrever à maneira dos romanos, com tabuinhas enceradas e estiletes, inscrevendo o seu praenomen, nomen e cognomen nas tabuinhas previamente distribuídas;
- “OPERA MUSIVA”; depois da visita à villa (casa de campo) romana, cujo pavimento é revestido de mosaico, os alunos são ensinados na arte da construção do mosaico romano;

A vila romana exterior ao museu, a igreja (tradicional na zona e tão semelhante à da Terrugem), um pequeno jardim, a entrada do museu onde se destacam colunas clássicas,a escola de restauro mesmo em frente ao museu, a excelente biblioteca...enfim, tudo isto contribui para uma agradável visita, onde pontificam...O VERDE E O SILÊNCIO.

sábado, 16 de outubro de 2010

UM CONSELHO DE LEITURA: INÊS DE PORTUGAL

Referência bibliográfica: Aguiar, João, Inês de Portugal, 3ª ed., Leya editores, Alfragide, 2008.

Inês de Portugal é um livro invulgar: parte de uma experiência inversa em relação ao habitual. De facto, o filme antecipou a existência do livro, que teve por base o guião construído previamente. De forma que a obra, sofrendo a devida expansão literária, foi influenciada pelas técnicas do cinema, sobretudo o flash-back, utilizado repetidamente, bem como a técnica do corte e montagem que no livro é representada por hiatos na mancha gráfica.
No domínio da narrativa existe uma acção principal e outras secundárias que são apresentadas em sequências alternadas, (nomenclatura com origem em Bremond, cf. Reis, Dicionário de Narratologia, 2005: 376). A vantagem desta fuga à linearidade da acção, acentuada pelos flash-backs é a de surpreender e interessar o leitor, mostrando o passado feliz dos apaixonados, Pedro e Inês, passado que contrasta enormemente com a loucura de D.Pedro, num tempo presente.
O lirismo desta história é consolidado pelo processo figurativo com predominância na metáfora, não esquecendo que a própria história é paradigmática (sempre foi e sempre o será) em relação à paixão entre um homem e uma mulher, independentemente da respectiva condição. Trata-se de uma apologia ao amor, que se elevou à condição de mito o longo dos séculos.
Por outro lado, nesta ficção evoluem personagens desenquadradas historicamente, tal como Álvaro Pais (que teve importância declarada durante o reinado de D. Fernando, tendo sido, igualmente, um dos conspiradores da revolução que ocorreu, em 1383, nas ruas da cidade de Lisboa). No posfácio, Aguiar confirma a existência de uma liberdade ficcional, que lhe permitiu reinterpretar a focalização de Fernão Lopes e Rui de Pina:

“Inês de Portugal é um romance e não um ensaio de reconstituição histórica, embora na sua elaboração eu me tenha socorrido das crónicas de Fernão Lopes e Rui de Pina.” (Aguiar, 2008: 109)

Inês de Portugal tem como fonte principal a Crónica de D. Pedro I, designadamente os episódios relativos aos amores de Pedro e Inês, história trágica, narrada por Fernão Lopes, que termina com o casamento do herói com a amada já morta.
João de Aguiar arquitectou uma história pitoresca, transfigurando a visão histórica normativa presente na cronística medieval (geralmente favorável aos biografados); o insólito encontra-se, também, na desconstrução histórica de uma outra personagem: Afonso Madeira (caracterizado por Lopes de uma maneira absolutamente distinta);
POR TODAS ESTAS REFERÊNCIAS FICA UM CONSELHO: A LEITURA DO LIVRO E A VISÃO DO FILME...OU VICE-VERSA.

RESPOSTA AO DESAFIO EXISTENTE NO TEXTO ANTERIOR

Caros amigos,

O texto anterior foi um exercício realizado por Miguel Moedas, quando frequentou um curso de escrita criativa.

Surpreendidos?

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

TEXTO "À CLEF", OU FICÇÃO?

Miguel Moedas (professor) enviou-nos o seguinte texto. Fica a pergunta para o leitor: trata-se de um texto de escrita lúdica ou de um texto confessional, autobiográfico,com base em personagens e situações reais, enfim uma catárse em prosa poética (aconselha-se a leitura de"Autopsicografia" para que se possa responder à questão)?

MÃE HÁ SÓ UMA
Não me peças para te amar como me amaste. Não me peças para te carregar como me carregaste.
Mãe és de alguém que eu já fui. Filha sou de alguém que já não és tu.
Morrestes tu para mim quando eu nasci. Morri eu para ti quando deste à luz. Ausentes ficámos, eu do teu tempo, tu do meu espaço. Moeda de troca para a felicidade alheia.
Deste-me um nome que não é o meu. Teu nome não sei que chamar.
Não sou a varanda solarenga que gostavas que fosse. Sou antes o sótão grande e escuro da tua alma.
Aquele sítio só teu onde comemoraste cada um dos meus aniversários. Onde imaginaste cada um dos meus sorrisos. Onde te angustiaste com cada um dos meus choros que nunca escutaste. Onde rezaste para que eu recuperasse das doenças que nunca tive.
Ferida aberta, pequena para albergar a infecção do teu remorso. Lugar onde cresce mais e mais a tua angústia, agora que fotocopias a tua velhice no espelho de cada manhã.
Não. Não me peças para te falar das netas que não tens e nas quais insistes em encontrar a menina que tantas vezes espreitaste, ao longe, e que nunca tiveste a coragem de reclamar. Só para ti. Só tua. A menina que não consolaste no dia em que ficou órfã da mãe que nunca teve. A menina que não protegeste da maldade do mundo. A menina que não ensinaste a ser mulher.
Estás fechada a cadeado na cave mais minúscula do meu coração. Parte de mim que eu não conheço e que todos os dias enterro mais fundo num ritual de esquecimento. Parte de mim que eu nunca tive, guardado na parte de ti que tu nunca terás.
Viajámos a vida em carruagens diferentes. Onde tu sais eu entrei, onde tu entraste eu saio. Cruzamo-nos sempre sem nunca nos encontrarmos, bilhete só de ida na mão. Olho para ti sem te ver. Tu vês-me sem me olhar. Faces diferentes da cegueira de almas gémeas condenadas por insolvência.
Esgrime os teus argumentos com a tua consciência. Só tu podes acusar-te e defender-te. Ajuíza-te em causa própria. Absolve-te e condena-te. Só tu podes perdoar-te a pena a que já te condenaste.
Expulsaste-me duplamente. De dentro de ti e para fora de ti. Vazia em dobro ficaste, abortada de amor.
Abandona-me agora que eu não te quero encontrar.
Mãe há só uma e não és tu.

Miguel Moedas

MATÉRIA PARA O TESTE DO 9º ANO

1 - LITERATURA PORTUGUESA/ESTUDOS LITERÁRIOS
Biografia de Gil Vicente
Bibliografia produzida pelo autor
Contextualização entre a obra produzida e a época
Referências literárias do dramaturgo
Manifestações teatrais pré-vicentinas
Autos, Farsas, Moralidades (definição)
Auto da Barca do Inferno – cenas I, II, III e IV (assunto)
Comparação entre Parvos vicentinos
Leitura e análise sumária de O Monólogo do Vaqueiro (em função da evolução do percurso teatral do autor e do respectivo mecenato)
Definição de alegoria e símbolo
Categorias da narrativa – personagens-tipo e personagens modeladas; caracterização directa e indirecta das personagens
Os três tipos de cómico existentes nos autos vicentinos; aplicação prática
Recursos retóricos relevantes nas peças de Mestre Gil: eufemismo, ironia e outros estudados em anos anteriores

2 – GRAMÁTICA
Revisões de anos anteriores – Morfologia e Sintaxe, em função da produção de textos coerentes, irrepreensíveis
Registos de Língua
História e evolução da Língua Portuguesa – palavras divergentes e convergentes, estrangeirismos, neologismos; Língua de Estrato, Substratos e Superstratos
Importância da Língua Portuguesa; variedades; dialectos
Evolução semântica de palavras (casos paradigmáticos)

3- OFICINA DE ESCRITA
Reacção a textos lúdicos de diferente tipologia: prosa poética; texto de opinião; descrição literária; resumo; textos não literários (noções da estrutura. Exemplo: cartas formais e informais; actas, etc.)

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

JOGOS DE PORTUGUÊS

Entre vários livros onde existe uma abordagem lúdica da Língua, gostaríamos, desde já, de destacar um, “Entretenimentos de Português”, da autoria do Padre Linhares (cf. Linhares,1986:63). Mais tarde falaremos de outros, que muito nos dizem.
Nas páginas 62/63, desta compilação de textos, escritos em forma de diário, existe um interessante jogo sobre vozes de animais. Sendo assim, e para as dez primeiras vozes deixamos os respectivos verbos unipessoais. Em relação aos restantes fica o desafio para os leitores:

1 - Abutre (crocitar); avestruz (rugir); baleia (urrar); doninha (chiar); escaravelho (zunir); faisão (assobiar); flamingo (roncar); lagarto (farfalhar); pato-bravo (palrar); urso (fremir).

2 – Cobra (…); coelho (…); crocodilo (…); coruja (…); javali (...); águia (…); bezerro (…); gralha (…); gato (…); sapo (…).

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

HOLMES E A F.S

Após ter estado com Mr. Predicado Verbal, Holmes voltou a olhar de soslaio as notícias do dia e soltou um "Ah!" prolongado, enquanto se recostava no sofá de veludo azul.
- Não terá sido este rapto obra daquela misteriosa organização, a F.S? – inquiriu o meu amigo. Na verdade não perguntava, pensava, isso sim, em voz alta.
- Não, Holmes, essa organização que refere, a “Função Sintáctica” tem estado bastante serena. O seu chefe, o misterioso Vocativo (também conhecido por Ó) tem estado, sereno, nas praias de Southsea. O cérebro do grupo, o Sujeito Simples, tem estado omisso (ou subentendido) em New Forest. E depois aquele tipo terrível, o Predicado Nominal, de Liverpool, sempre acompanhado pelo Verbo Copulativo, tem estado entretido com os filhos: Ser, Estar, Ficar, Permanecer. Aquela prole não lhe dá um minuto de descanso, caro amigo!
Holmes ficou de repente absorto, quase catatónico. Levantou-se e, num ápice, gritou:
- Vamos a Croydon! Aí encontraremos, de certeza, um amigo que conheci na Boémia, Hans. O seu nome de código, entre agentes secretos, é Complemento Determinativo, ou Nome+de+Nome. É homem para nos dar as informações que pretendemos.
-Estranho nome –retorqui. Enquanto descia as escadas as imagens da minha estadia na Índia iam passando de relance no meu pensamento. O modo, o lugar, o tempo, a causa, o lugar foram circunstâncias que me levaram à terra de Mogli.Aí combati, aí exerci medicina. Aí era conhecido pelo aposto que me consagraram: Watson, o médico inglês, cura os seus doentes!
- Watson, cuidado com as escadas. Acorde, homem!
CONTINUA…

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

UMA ENIGMÁTICA AVENTURA DE SHERLOCK HOLMES

No Verão de 1889, dirigi-me a Baker Street. Antes de entrar, por volta das 20.00h, reparei na silhueta de Holmes que contratava com a luz dos seus aposentos. O célebre detective movia-se energicamente e, ao entrar na sala do seu apartamento, percebi que nem a minha entrada lhe retirara a concentração na tarefa que iniciara, nem a vontade de fumar com avidez o cachimbo que usava há anos. Remexia em livros e maços de papéis e murmurava, repetidamente, uma palavra que terminava em "iva". Estancou e, reconhecendo-me, cumprimentou o velho companheiro.
- Com tem passado, Watson? Vejo que a sua esposa tem estado fora, possivelmente na Cornualha e que o meu amigo tem almoçado à pressa.
- Mas, como é que adivinhou, Holmes?
- Ora, meu amigo, é visível para qualquer curioso que o vinco das suas calças está torto. Se reparar, no lado direito do seu casaco, encontra uma pequena nódoa amarela. Damn, Watson, você foi sempre tão calmo e ponderado!
- O seu poder de dedução é notável, Holmes! – Respondi.
- Mais ainda, tem uma batata frita no bolso direito do seu casaco.
- Bom, bom, Holmes – retorqui – isto começa a ser embaraçoso! Diga-me. Reparei, ao entrar, que estava nervoso, folheava livros, papéis…
- Sim – respondeu - recebi uma estranha carta. Queira ler em voz alta, por obséquio. A mensagem era esclarecedora.

“Caro, Sherlock Holmes

Como representante da imobiliária “Sintaxe”, queria consultá-lo acerca de um estranho desaparecimento, o da nossa melhor vendedora. O seu nome? Oração Coordenada Conclusiva! Sei que tem resolvido casos complicados em todo o mundo. Derrotou Moriarty! Por isso lhe peço que me receba hoje, 23 de Agosto de 1889, por volta das 20.30h”

Exactamente nesse momento ouviu-se um trote de cavalos e uma carruagem a parar. De lá saiu um cavalheiro, que subiu com energia ao primeiro andar, do nº 59, onde nos encontrávamos.
Holmes abriu a porta e logo se nos deparou um homem alto, que trazia na mão um chapéu alto de aba longa e um monóculo a condizer. Holmes indicou-lhe uma chaise longue.
- Tenha a bondade de se sentar. Com quem tenho a honra de falar?
- Predicado verbal. Mas pode só chamar-me de Mr. Predicado.
- Então o que tem para nos contar senhor Predicado…Verbal? – Inquiriu o meu amigo.
- Gostaria, em primeiro lugar, que mantivessem sigilo sobre o que vos vou contar. Pois, então, comecemos!
A nossa melhor empregada, Miss Oração Coordenada Conclusiva, desapareceu, misteriosamente, num castelo da Boémia, quando procurava vender o nosso melhor Kit: “Sujeito-Predicado-C.D-C.Ind-C.Circunstancial”.
Esta nossa empregada era uma mulher independente, geralmente acompanhava com uma amiga de infância, também ela Oração Coordenada e de uma outra familiar, de quem dependia inteiramente, a Conjunção “Portanto”. Esta última dotada de grande instabilidade psicológica, porque tanto pode ser”portanto”, como “logo” ou “por consequência”.
Ora, do nosso conjunto de vendedoras: a Oração Coordenada Copulativa, a Coordenada Adversativa e a Explicativa, nenhuma nos parece ter sido autora efectiva desse rapto inexplicável.
No entanto, desconfiamos de uma vendedora de uma outra firma rival: a Oração Subordinada Relativa sempre acompanhada do misterioso amigo, o Pronome Relativo…
SERÁ QUE HOLMES IRÁ RESOLVER ESTE TERRÍVEL MISTÉRIO?
CONTINUA!

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

NEM UM SÓ DIA SEM ESCREVER UMA LINHA!

Nulla dies sine linea

É certo e sabido que a prática da escrita deve ser diária, permanente. Só assim se consegue textos estética e estruturalmente irrepreensíveis. Apeles, pintor grego na Jónia do século IV, considerava que o sucesso do seu trabalho provinha da ideia, própria, que o levava a não esquecer os seus deveres diários como pintor. Plínio revelou ao mundo o trabalho de Apeles, no seu livro História Natural, 35, 36. Todos os dias, o excelso pintor traçava linhas que delimitavam soberbas pinturas como a de Artemisa ou a de Herácles. Esta ideia, a da prática diária, é também frequente entre escritores e é conhecido que alguns (até) se levantam de madrugada para escrever, qual morcegos noctívagos.
Contudo, para além da maxima latina deixada em subtítulo, gostaríamos de vos referir uma outra: "Quis scribit bis legit", quem escreve lê duas vezes. Uma leitura sem posterior reflexão escrita, acaba por ser inócua.
Por toda esta...arte, nada de menosprezarmos os poetas! Nas suas Sátiras, I, 9, Juvenal, poeta romano, deixou, para a posteridade, uma outra frase célebre: "facit indignatio versum"...a indigação faz o verso. A indignação pode ser geradora da poesia!

domingo, 3 de outubro de 2010

1 - A LÍNGUA PORTUGUESA NO MUNDO

(destinatários: alunos do 9º ano)


Palavras-chave e expressões para reflexão:
3000 a 6000 línguas que são faladas no mundo/ 283 línguas têm menos de mil falantes/ língua – conceito político, económico e cultural/ Mirandês: exemplo de uma língua minoritária em Portugal/ Línguas mais faladas no mundo – 1º Mandarim, 2º Hindi, 3º Inglês, 4º Espanhol, 5º Árabe, 6º Português/ Inglês como língua de comunicação/ línguas oficiais, francas e maternas/Português, língua nacional; Português com língua oficial: Angola, Moçambique, cabo Verde, Guiné, São Tomé e Príncipe e Macau/crioulos de origem portuguesa/variedades: variante Portuguesa do Brasil (características: vogais átonas pouco reduzidas – ex. partir; palatização de /t/ e /d/ - ex: tio, semivocalização de /l/ em final de sílaba - ex: animal; introdução de /i/ epentético – ex: capitura; utilização das formas casuais dos pronomes pessoais – ex: eu vi ele na rua; construção aspectual – ex: estava brincando; utilização de preposições – ex: foi na cidade; emprego dos verbos ter e haver – ex: tem fogo naquela casa; utilização de “você”; vocábulos de origem tupi: guri, capim, pipoca e de origem africana – moleque, miúdo, etc.

2- REGISTOS DE LÍNGUA

Palavras-chave e expressões para reflexão:
Registo corrente - norma - palavras e expressões simples – registo cuidado – pouco utilizado na oralidade, excepto em ocasiões solenes (ou em aulas de Língua Portuguesa!) vocabulário rebuscado – construção gramatical complexa - registo familiar – vocabulário simples, pouco variado – usado em família – registo popular – gira – calão – linguagem técnico-científica

Bibliografia:

GUERRA, João Augusto, Português, Ensino Recorrente, Porto Editora, Porto, 1998, p. 105
MATEUS, Maria Helena Mira, Colóquio ”Portugal e as Línguas estrangeiras no século XXI”, Universidade de Lisboa, 3 de Novembro de 2008
PINTO, José Castro et alii, Gramática do Português Moderno, 3ª edição, Plátano Editora, Lisboa, 1995

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

História de uma Gaivota e do Gato que a ensinou a voar, de Luís Sepúlveda

1 – O RESUMO

O autor chileno apresenta-nos a história de um gato grande e gordo e de uma gaivota, Kengah, que é apanhada por uma maré negra de petróleo e que, às portas da morte, após pôr um ovo, obriga o seu novo amigo, Zorbas, a prometer-lhe que não o comerá, que criará a sua cria e a ensinará a voar.

Para esta tarefa, Zorbas, o gato, vai necessitar da ajuda dos seus amigos, outros gatos habituados à vida dura do porto de Hamburgo (é de lembrar que Sepúlveda esteve refugiado na Alemanha, ele que foi sempre um activista político), Secretário, Sabetudo, Barlavento e Colonello. Zorbas vai cumprir a sua promessa até ao fim, pois o seu código de honra – o dos gatos do porto - assim o exige. A tarefa é árdua, mas Zorbas não desiste. Ele vai chocar o ovo até a pequena gaivota nascer, alimenta-a, procurando insectos e protege-a de uma ratazana que a quer comer. Chamou-a Ditosa e restava, agora, a última e mais difícil tarefa, ensiná-la a voar.

Zorbas precisa da ajuda de um humano, decide então falar com um humano e o escolhido é “O Poeta” (Sepúlveda começou por ser um poeta e mais tarde tornou-se prosador. No entanto, neste livro a poesia está omnipresente). Após o susto inicial, por ver que Zorbas conseguia falar com ele, ou como o gato dizia "miar na língua dos humanos", o humano ajuda o gato e ambos conseguem que Ditosa voe.

Luís Sepúlveda apresenta-nos uma fábula onde o Homem é criticado pelo seu papel de destruidor do meio ambiente. De assinalar que o próprio autor foi activista do Greenpeace, pelo que a acção nefasta do homem na natureza é assinalada com veemência (tenha-se em conta a catástrofe inicial, a morte de Kengah).

Contudo, a mensagem principal do autor está resumida na última frase de Zorbas: “Que só voa quem se atreve a fazê-lo”… e os poetas vão sempre mais além.

Uma obra cuja leitura é aconselhável a jovens e adultos (é de relembrar que os leitores/destinatários de Esopo…eram sobretudo adultos), e que nos faz pensar no nosso papel no universo, alertando-nos para os verdadeiros valores, por vezes tão esquecidos: a convivência entre seres distintos (gatos/gaivotas/”poetas”), a preservação da natureza.

MEHR LICHT!

Johann Wolfgang von Goethe, romântico alemão, murmurou um esclarecedor pedido ao morrer. Esse pedido como que ecoou, a partir da cidade de Weimar, para todo o mundo: - MEHR LICHT! Pedia o sábio alemão que abrissem uma janela para entrar mais claridade, aparentemente uma simples alusão própria do quotidiano do escritor. Contudo, a mensagem que está subjacente a este pedido é a seguinte: "Mais instrução, mais saber, mais verdade!".